Pela 1ª vez na história, Brasil ultrapassa 71 milhões de inadimplentes
O Brasil atingiu, em maio, o maior número de inadimplentes da série histórica da Serasa: 77 milhões de pessoas. Os dados apontam que, em média, cada endividado deve R$ 6.036, e o total das dívidas chega a R$ 465 bilhões.
Estar inadimplente pode dificultar o acesso ao crédito, levar à negativação do nome e até à perda de bens. Mas quem tem contas em atraso é protegido por uma série de leis federais, que garantem direitos e impõem limites aos credores.
O g1 ouviu especialistas e explica abaixo quais são essas normas:
Lei do Desenrola (2023)
Criada para facilitar a negociação de dívidas, a Lei do Desenrola ajudou a reduzir em 2 milhões o número de inadimplentes nos primeiros 10 meses, segundo dados do governo.
A norma também fixou limites para os juros do rotativo do cartão de crédito, impedindo que a dívida ultrapasse o dobro do valor original.
“Essa regra diminui a chance de os consumidores entrarem em espirais de dívida, mas o teto atual, de 100%, ainda é bastante alto. É preciso ter cuidado”, afirma Roberto Pfeiffer, professor de direito comercial e ex-diretor do Procon.
Lei do Superendividamento (2021)
Aprovada em 2021, essa lei modificou o Código de Defesa do Consumidor e passou a permitir que o endividado procure a Justiça para apresentar um plano de pagamento que envolva todos os credores, semelhante à recuperação judicial das empresas.
“O indivíduo mais pobre, que vê as dívidas comerem a maior parte da renda, pode procurar um juiz para desenhar um programa que reúna vários credores ao mesmo tempo”, explica Fernando Eberlin, professor de direito econômico da FGV.
A legislação também garante ao consumidor o chamado “mínimo existencial” — valor destinado a despesas básicas, como alimentação, moradia e saúde. Hoje, essa quantia está estimada em cerca de R$ 600.
“É um valor pequeno, que precisa ser repensado, e já existe um debate na Justiça para aumentá-lo nos próximos anos”, diz Eberlin.
Estatuto do Idoso (2003)
O artigo 104 do Estatuto do Idoso proíbe a retenção de documentos e cartões como forma de cobrança de dívidas de pessoas com mais de 60 anos — prática que já foi comum em algumas regiões do país.
“Essa previsão legal existe porque a retenção de documentos é um ato que beira a extorsão, uma forma de pressionar o idoso a pagar mais rapidamente”, explica Roberto Pfeiffer.
A pena prevista é de seis meses a dois anos de detenção, além de multa.
Código de Defesa do Consumidor (1990)
O CDC é uma das principais normas de proteção aos consumidores, inclusive os inadimplentes.
O artigo 42 determina que o consumidor não pode ser exposto ao ridículo ou constrangido durante a cobrança.
O artigo 71 classifica como infração penal o uso de ameaça, coação ou constrangimento físico ou moral, com pena de até um ano de detenção e multa.
O artigo 43 garante o acesso às informações de cadastros e registros e estabelece que a negativação por uma mesma dívida não pode durar mais de cinco anos.
“O direito à informação é um dos pilares do Código. Detalhes sobre débitos devem ser expostos de forma clara, simples e acessível”, afirma Rodrigo Salgado, professor de direito econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Em 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o consumidor deve ser notificado em seu endereço antes da inclusão em cadastros de inadimplentes.
Constituição Federal (1988)
A Constituição também prevê direitos fundamentais ao cidadão inadimplente:
O artigo 5º, inciso LXVII, determina que ninguém será preso por dívida, exceto no caso de pensão alimentícia.
O princípio do devido processo legal garante que toda cobrança deve seguir a lei e respeitar a dignidade humana.
“O devido processo legal é um importante direito fundamental. Toda cobrança deve ocorrer sem atos desproporcionais ou vexatórios”, diz Pfeiffer.
“Além disso, o direito do consumidor é um direito fundamental. Consequentemente, o consumidor endividado encontra um amparo a mais na Constituição.”
Endividamento em alta
Segundo a Serasa, os 77 milhões de brasileiros inadimplentes acumulam:
R$ 465 bilhões em dívidas;
298,5 milhões de registros de débitos, o maior volume da série histórica;
Valor médio de dívida por inadimplente: R$ 6.036, aumento de 1% em relação a abril.
77 milhões de inadimplentes: conheça cinco leis que protegem quem tem contas atrasadas
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