Página Inicial Saúde Estudo aponta novo tratamento para cura da hanseníase – 26/06/2025 – Equilíbrio e Saúde

Estudo aponta novo tratamento para cura da hanseníase – 26/06/2025 – Equilíbrio e Saúde

Publicado pela Redação

Um estudo da USP (Universidade de São Paulo) aponta para uma combinação terapêutica que pode ser mais eficaz na cura e no controle dos sintomas da hanseníase, doença infecciosa crônica antes conhecida como lepra. A pesquisa, publicada na Revista Brasileira de Doenças Infecciosas, comparou o novo esquema com o tratamento padrão utilizado no SUS (Sistema Único de Saúde).

Os pesquisadores avaliaram a combinação de quatro antibióticos: rifampicina, moxifloxacina, claritromicina e minociclina. O tratamento foi batizado de Rimoxclamin. No Brasil, o tratamento padrão é a poliquimioterapia única, recomendada pela OMS (Organização Mundial de Saúde), e que também combina antibióticos.

O estudo comparou os dois esquemas terapêuticos em 66 casos de hanseníase diagnosticados entre 2015 e 2023. Desse total, 46 pacientes foram tratados com o novo esquema e 20 com a poliquimioterapia convencional. Ambos os tratamentos duram cerca de 12 meses.

Segundo o dermatologista Marco Andrey Cipriani Frade, professor da USP Ribeirão Preto e presidente da SBH (Sociedade Brasileira de Hansenologia), o objetivo foi potencializar a ação bactericida contra o Mycobacterium leprae, bactéria causadora da hanseníase.

“O esquema convencional conta com apenas uma droga bactericida, a rifampicina, associada à dapsona e à clofazimina, que são bacteriostáticas, ou seja, mais lentas na atuação contra o bacilo [a bactéria causadora da hanseníase]”, afirma Frade. “O Rimoxclamin usa três antibióticos altamente bactericidas já nos dois primeiros meses, o que resulta em resposta clínica muito mais rápida.”

A pesquisa mostra que o Rimoxclamin foi superior na recuperação rápida dos danos neurológicos, especialmente da sensibilidade nas mãos e pés. A melhora começou a ser observada já no terceiro mês.

Além disso, a redução do espessamento nervoso —quando os nervos se tornam visivelmente mais grossos e rígidos ao toque por causa da inflamação— foi mais significativa com o novo tratamento. No grupo do Rimoxclamin, esse sinal caiu de 65% para 28% dos pacientes em seis meses. Já entre os que receberam o esquema convencional, a queda foi de 95% para 40%, mas apenas ao fim de um ano.

Outro achado relevante foi a redução mais precoce de sintomas como dormência e formigamento no grupo do novo tratamento. “Em três meses, vimos uma melhora significativa de quase todos os sintomas neurológicos, exceto a fraqueza. Isso não foi observado com o tratamento padrão”, afirma Frade.

Além da eficácia, o novo esquema apresentou melhor tolerabilidade. Reações adversas foram registradas em 85% dos pacientes do grupo que recebeu a poliquimioterapia tradicional, contra 52% no grupo Rimoxclamin. Dor abdominal, fadiga e mal-estar foram os efeitos colaterais mais comuns entre os que usaram o tratamento padrão. Sete pacientes precisaram trocar de esquema, principalmente por anemia.

No grupo do novo tratamento, os efeitos foram leves e não exigiram interrupções. Segundo Frade, a proposta do Rimoxclamin é substituir os antibióticos mais tóxicos por opções com ação bactericida mais intensa e melhor perfil de segurança.

“A dapsona e a clofazimina estão associadas a efeitos adversos importantes, como anemia hemolítica, metemoglobinemia e síndrome de hipersensibilidade, o que pode comprometer a adesão e a qualidade de vida dos pacientes.”

O novo esquema ainda não está disponível no SUS. Frade afirma, no entanto, que o Ministério da Saúde abriu uma revisão do protocolo clínico para hanseníase, e que o novo tratamento está sendo analisado pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS).

A expectativa do médico é que o Rimoxclamin seja incorporado no SUS como esquema de primeira linha de tratamento contra a doença, mas ainda não há um prazo para que isso aconteça. Frade acredita que o processo possa ser ágil, já que os quatro medicamentos usados na combinação já são aprovados para outras indicações.

“Temos um único protocolo de tratamento para a hanseníase no país há mais de quatro décadas. Já está mais do que na hora de oferecer uma alternativa mais eficaz”, diz.

Uma tese de doutorado da USP, defendida por José Marcelo de Castro sob orientação de Frade em 2019, analisou os custos sociais da hanseníase no Brasil. O estudo avaliou os benefícios concedidos pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) entre 2000 e 2019.

No período, foram pagos cerca de US$ 925 milhões em aposentadorias, auxílios-doença e outros benefícios a pessoas afetadas pela hanseníase. Segundo o autor, esses gastos apenas compensaram as perdas funcionais dos pacientes, sem contribuir diretamente para o controle da doença.

A região Sudeste concentrou a maior parte das concessões, enquanto estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, regiões com menos recursos, somaram mais da metade dos novos casos registrados.

O Brasil é o segundo país do mundo com o maior número de casos de hanseníase, ficando atrás apenas da Índia. Em 2023, foram registrados cerca de 22.773 novos casos no país, o que representa cerca de 12,5% do total global, de acordo com dados do Ministério da Saúde e da OMS.

Diagnóstico precoce da hanseníase ainda é desafio

Segundo o dermatologista Lucas Giordani, do Hospital Santa Paula, uma das particularidades da bactéria causadora da hanseníase é seu lento processo de multiplicação, o que faz com que os sintomas possam demorar anos para aparecer. A transmissão ocorre principalmente por contato próximo e prolongado com pessoas infectados.

“Apesar disso, a maioria das pessoas expostas não desenvolve a doença, o que indica uma resposta imunológica eficaz na maior parte da população”, afirma Giordani.

O diagnóstico é clínico, baseado em avaliação das lesões cutâneas e palpação dos nervos, mas Giordani aponta que é comum que exames complementares, como biópsias e ultrassonografia de nervos, sejam necessários para confirmar a suspeita e orientar o tratamento.

Os sintomas mais comuns da doença são manchas na pele com perda de sensibilidade térmica, dolorosa e tátil. Casos mais avançados podem apresentar nódulos, descamação e dor. Se não tratada precocemente, a hanseníase pode causar deformidades, como colapso do nariz e comprometimento dos membros.

“Embora essas formas mais graves sejam menos frequentes hoje, ainda são observadas com regularidade”, alerta.

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