Pesquisadores americanos deram mais um passo na busca por biomarcadores da demência frontotemporal. Em estudo publicado em junho na revista Nature Aging, eles identificaram 31 módulos de coexpressão proteica, um conjunto de moléculas cuja presença pode auxiliar no diagnóstico da doença.
Segundo Amer Hamdan, professor da UFPR (Universidade Federal do Paraná), o trabalho representa um avanço importante para a identificação correta dos quadros de demência frontotemporal e seu diagnóstico.
“É um estudo sofisticado e abrangente. Pode ser um primeiro passo para entender os mecanismos iniciais da doença. O grande desafio agora é a identificação precoce”, diz.
A demência frontotemporal é, na verdade, um conjunto de demências que tem como principal característica o comprometimento das regiões frontal e temporal do cérebro, a primeira relacionada à função motora e à regulação do comportamento, entre outras, e a segunda ligada à memória e à linguagem. Costuma se manifestar de duas formas principais, com alterações comportamentais e na linguagem. Também pode afetar o sistema motor.
Embora já figure como a segunda forma mais comum de demência entre os 50 e 60 anos de idade, atrás apenas do Alzheimer, a demência frontotemporal ainda é subdiagnosticada. Uma das dificuldades para identificar os casos da doença é sua similaridade com outros tipos de problemas neurológicos.
“É um diagnóstico por exclusão”, afirma Hamdan. Ao chegar na clínica com os sintomas característicos, o paciente ainda tem que passar por exames de neuroimagem, como ressonância magnética, para descartar outras causas do problema, como tumores. Além disso, o neurologista deve analisar o histórico médico do paciente e realizar uma avaliação neuropsicológica para identificar mudanças comportamentais.
Os novos biomarcadores podem, no futuro, constituir um exame extra para a confirmação do caso clínico, como já acontece hoje com demências como o Alzheimer. Além disso, poderão servir como preditores em casos de surgimento precoce dos sintomas, em pacientes que já possuam histórico familiar.
Para chegar à descoberta, os cientistas analisaram o líquido cefalorraquidiano de 116 pessoas com predisposição hereditária à doença e identificaram mais de 4.000 proteínas diferentes. Esses dados foram então comparados com as amostras de 39 familiares não afetados desses pacientes.
O estudo, contudo, ainda é preliminar e tem muitas limitações. Dentre as principais está o tamanho relativamente pequeno da amostra. É preciso conduzir estudos em maior escala para descobrir, por exemplo, se essas proteínas servem de sinalizadores em toda a população, inclusive de diferentes etnias.
Fernando Paschoal Júnior, professor e pesquisador da UFPA (Universidade Federal do Pará), chama a atenção para a importância da observação do comportamento do paciente no diagnóstico —segundo ele, na maioria dos casos a suspeita surge por alterações no comportamento.
Aos primeiros sinais da doença, muitos recebem diagnóstico equivocado de transtornos mentais porque ficam agressivos, agitados e perdem a inibição, algo pouco típico de outras demências como o Alzheimer. “Por isso é comum irem primeiro ao psiquiatra, antes de chegarem ao neurologista”, afirma.
Um dos sintomas marcantes da demência frontotemporal do subtipo comportamental é a perda da capacidade de empatia. Outra pesquisa, publicada em dezembro, mostrou que pacientes com a doença têm menor atividade cerebral na região responsável pela empatia afetiva, aquela que nos torna capazes de nos colocar no lugar do outro.
Nesse estudo, 28 pacientes e 28 participantes saudáveis foram submetidos a um exame de ressonância durante o qual viram duas séries de imagens. Na primeira, uma mão sendo tocada com um cotonete e, na segunda, uma mão perfurada com uma agulha.
Os resultados, assim como o estudo mais recente, também mostraram que os pacientes com demência frontotemporal não perdem a capacidade de sentir empatia cognitiva, isto é, continuam capazes de entender o sofrimento, embora deixem de compartilhar do mesmo.
A doença não tem cura, e o tratamento disponível atualmente visa apenas retardar seu avanço ou aliviar os sintomas. Por isso, ficar atento ao surgimento dos primeiros sinais para buscar o quanto antes um diagnóstico correto é fundamental.
Nesse sentido, um recurso que pode ajudar são os aparelhos celulares. Uma pesquisa publicada em 2024 revelou que testes cognitivos realizados por celular mostraram-se eficazes para detectar sinais precoces da demência frontotemporal e podem contribuir para o rastreio e o acompanhamento remoto da condição.
Para validar essa metodologia, 360 pessoas, entre assintomáticos e com diagnóstico, completaram três rodadas de testes cognitivos via aplicativo de celular, ao longo de duas semanas, com tarefas de funções executivas e de memória associativa. Além disso, fizeram exames clínicos presenciais padrão e de ressonância magnética cerebral.
Nos resultados, as avaliações mostraram alta consistência interna e boa confiabilidade teste-reteste. Ainda que incipientes, descobertas como essa mostram que está cada vez mais próximo o futuro no qual a identificação precoce e da demência frontotemporal se tornará uma realidade.