Página Inicial Saúde Câncer de colo do útero: tratamento começa tarde no SUS – 13/04/2025 – Equilíbrio e Saúde

Câncer de colo do útero: tratamento começa tarde no SUS – 13/04/2025 – Equilíbrio e Saúde

Publicado pela Redação

Um estudo do Observatório de Oncologia aponta que 80,5% das mulheres atendidas com câncer do colo do útero na saúde pública iniciaram o tratamento com radioterapia após o prazo legal de 60 dias, com uma média de 117 dias de espera. A pesquisa analisou dados do SUS (Sistema Único de Saúde) entre 2019 e 2023.

No período, foram realizados 251 mil atendimentos de quimioterapia para 54.290 pacientes em tratamento. Na radioterapia, o total foi de 53 mil atendimentos para 47 mil pessoas. Quanto ao tratamento inicial, 33,7% das mulheres fizeram terapia combinada (quimioterapia e radioterapia), enquanto 31,8% receberam apenas cirurgia e 13,8% somente radioterapia.

O estudo, publicado em fevereiro, mostrou que, entre as mulheres que iniciaram o tratamento apenas com radioterapia ou de forma combinada, o tempo de espera ultrapassou o limite previsto na Lei 12.732/2012. A legislação determina que o primeiro tratamento oncológico no SUS deve começar em até 60 dias após o diagnóstico.

Em nota, o Ministério da Saúde diz que devido à variação entre os casos de câncer do colo do útero, à falta de dados sobre o estadiamento [processo de avaliar a extensão e o local de um câncer no corpo] e à imprecisão na data de indicação da radioterapia, “não é possível afirmar com certeza que 80% das pacientes começam o tratamento com radioterapia após 60 dias da indicação”.

“Os dados gerais sobre o tratamento radioterápico no Brasil demonstram uma deficiência no número de procedimentos realizados em relação aos casos esperados de câncer em geral. Essa insuficiência já foi identificada pela atual gestão do Ministério da Saúde”, afirma.

O ministério diz ainda que tem atuado, em conjunto com estados e municípios, para lançar um conjunto de medidas de curto, médio e longo prazo nas próximas semanas. “O objetivo é criar uma lista nacional que integre a demanda dos pacientes, permitindo a regionalização da oferta e estruturando um sistema que organize a linha de cuidado do câncer, garantindo um tratamento radioterápico mais acessível e eficiente”.

Uma análise da ImpulsoGov, organização sem fins lucrativos que atua na gestão pública com uso de dados e tecnologia, mostra que, na última década, houve redução de quase 60% da taxa de tumores detectados em fase tardia no SUS. Em 2013, o estádio 4, o mais avançado da doença, representava 59,6% dos casos. Em 2024, essa fatia caiu para 24,4%.

A mesma análise aponta que os desafios de enfrentamento a esse tipo de câncer no SUS já começam na prevenção, de responsabilidade da atenção primária à saúde.

Só 0,48% dos municípios brasileiros atingiram a meta de cobertura do exame preventivo (papanicolau) preconizada pela OMS (Organização Mundial da Saúde), que é de 80% ou mais entre as mulheres de 25 a 64 anos a cada três anos.

Pelos parâmetros do Previne Brasil, um programa de financiamento da atenção primária criado no governo de Jair Bolsonaro (PL) e encerrado em abril de 2024, só 7,4% dos municípios alcançaram 40% de cobertura do exame preventivo citopatológico (papanicolau) —que era a meta do programa.

Disponível no SUS, o exame detecta nos estágios iniciais as possíveis alterações nas células do colo do útero que podem evoluir para o câncer. É indicado para mulheres entre 25 e 64 anos, que já tenham tido relação sexual. Após dois exames anuais negativos, a recomendação é que o intervalo entre os exames seja de três anos.

Segundo Juliana Ramalho, gerente de saúde pública da ImpulsoGov, há várias hipóteses que explicariam a baixa cobertura do exame. “Tem mulher, por exemplo, que não quer fazer o exame em uma unidade básica de saúde, prefere ir a uma clínica popular e pagar porque é mais fácil de marcar, o resultado sai rápido”, afirma.

Nesses casos, como não há compartilhamento de dados entre a saúde pública e a privada, a informação de que a mulher já fez o seu exame preventivo não aparece nos sistemas do SUS, e as taxas de cobertura do município ficam muito abaixo da meta.

Para Juliana, há gargalos a serem enfrentados em toda a jornada da mulher na rede pública de saúde. Na atenção primária, quando ela faz a coleta do exame e, às vezes, demora para ter o resultado. Na atenção secundária, quando precisa de uma biopsia e também enfrenta dificuldades. E na terciária, quando há atraso no início do tratamento.

“Quanto mais cedo a gente descobre esse câncer ou previne que ele aconteça, há uma economia de recursos, porque a prevenção é sempre muito mais barata do que o tratamento, e menos sofrimento para aquela mulher”, afirma.

Nina Melo, pesquisadora e coordenadora do Observatório de Oncologia, diz que quanto mais tarde o tratamento é iniciado, mais difícil se torna controlar a doença, o que aumenta as chances de óbito. Além disso, o agravamento da doença exige tratamentos mais agressivos que comprometem ainda mais a saúde e a qualidade de vida das pacientes.

“A detecção do câncer e o início do tratamento são como uma cadeia. Se o diagnóstico é tardio e o tratamento também começa tardiamente, é como um efeito dominó que só piora. Por isso, é essencial melhorar os indicadores de diagnóstico e garantir o início do tratamento no tempo oportuno”, afirma.

Segundo a pesquisadora, um dos problemas que geram mais casos e óbitos é a falta de prevenção e rastreamento efetivo para diagnóstico em estágios iniciais do câncer.

De acordo com a PNS (Pesquisa Nacional de Saúde) de 2019, as porcentagens de mulheres de 25 a 64 anos que nunca realizaram o exame Papanicolau variam entre as regiões do Brasil. As maiores taxas estão no Norte (8,5%), Nordeste (8,6%) e Centro-Oeste (7%). Já o Sudeste e o Sul apresentam as menores taxas, ambos com 4,5%.

Oncologista no Hospital Israelita Albert Einstein, Fernando Maluf explica que a realização periódica do exame Papanicolau e a vacinação contra o HPV são essenciais para a detecção precoce e prevenção do câncer de colo do útero.

“A vacina protege em mais de 90 a 95% das vezes alguém que ainda não teve contato com o vírus, mas a cobertura vacinal não passa de 50% no Brasil.”

No Brasil, são vacinadas crianças e adolescentes, meninos e meninas, de 9 a 14 anos para o HPV. Para Maluf, é importante que seja feita a vacinação nas escolas, porque muitos pais não sabem que precisam imunizar seus filhos.

“A melhor janela de oportunidade para a vacinação é dos 9 aos 14 anos nos meninos e meninas, que é quando você ainda não teve contato com o vírus por meio da relação sexual”, aponta.


O câncer do colo do útero, também conhecido como câncer cervical, é causado pela infecção persistente por tipos oncogênicos do HPV (Papilomavírus Humano). Esse vírus causa uma infecção sexualmente transmissível comum na população, e seu contágio poderia ser reduzido com o uso de preservativos.

De acordo com Inca (Instituto Nacional de Câncer), na maioria dos casos, a infecção pelo HPV não resulta em doença. No entanto, em algumas situações, pode causar alterações celulares que, ao longo dos anos, podem evoluir para o câncer.

Embora a doença seja evitável, é o terceiro tipo de câncer com maior risco de morte entre as mulheres, ficando atrás apenas do câncer de mama e do colorretal, segundo o Inca.

Por meio do SIM (Sistema de Informação de Mortalidade) do Ministério da Saúde, o estudo do Observatório de Oncologia mostrou que foram registrados 33.955 óbitos devido ao câncer do colo do útero entre 2019 e 2023.

A distribuição etária dos óbitos mostra que a maior parte das mortes ocorreu entre mulheres de 40 a 59 anos, sendo 20,8% na faixa de 40-49 anos e 20,9% na de 50-59 anos. O percentual de óbitos também é expressivo entre mulheres de 60 a 69 anos (19,3%) e 70 a 79 anos (14,1%).

A evolução do número de óbitos por ano demonstra um crescimento. Em 2019, foram registradas 6.596 mortes, número que subiu para 6.627 em 2020 e manteve-se relativamente estável em 2021, com 6.606. Já em 2022, houve um aumento para 6.983, chegando a 7.143 óbitos em 2023.

A distribuição racial dos óbitos indica que 49% das mulheres se autodeclararam pardas, enquanto 41,3% eram brancas e 8,6% pretas, refletindo uma desigualdade que pode estar associada a fatores como acesso ao diagnóstico precoce e tratamento adequado. A taxa de mortalidade para 2023 foi de 6,83 mortes por 100.000 mulheres.

O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde

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