Parecia puro marketing, quando as Irmãs do Vale (em inglês, Sisters of the Valley) começaram a chamar atenção com a pequena plantação de Cannabis no Vale Central da Califórnia, há pouco mais de uma década. Apesar do hábito religioso comum às freiras católicas, o grupo não pertencia à nenhuma ordem da igreja. As roupas “divinas” somadas a proposta mundana do grupo fizeram os negócios deslancharem. Rapidamente as vendas se internacionalizaram e até os brasileiros viraram clientes. Veio então a prova de que não se tratava apenas de marketing. Além de manter um faturamento médio anual de 1 milhão de dólares, As Irmãs do Vale foram uma das poucas empresas de CBD, na Califórnia, a obter o selo de confiança Better Business Bureau (BBB).
A marca vende apenas de produtos medicinais produzidos artesanalmente, à base de CBD (o composto da Cannabis sem efeito psicoativo) e uma quantidade ínfima de THC (composto psicoativo). Mesmo em um país onde a legislação é mais simpática, digamos, com a Cannabis, do que no Brasil, os obstáculo se multiplicam. O uso medicinal é permitido em 39 estados americanos, enquanto o recreativo, em 24. Pela lei federal, no entanto, a substância ainda está na lista 1 de produtos controlados, considerados com alto potencial de abuso, assim como a morfina e tantas outras– o que inviabilizou as vendas pelas redes sociais. A Meta, dona do Instagram e Facebook, de Mark Zuckerberg, proibiu o comércio pelas suas plataformas.
No fim do ano passada, as Irmãs do Vale lançaram uma petição direcionada à empresa, solicitando maior transparência e suporte para pequenos negócios. A empresa critica a prática de “shadow banning”, que limita o alcance de conteúdos, mesmo quando os negócios investem em publicidade paga. A estratégia faz parte de uma campanha do grupo em prol de um ambiente digital considerado por elas, “mais justo para empreendedores de setores alternativos”.
O grupo também não consegue espaço dentro dos dispensários da Califórnia, que são os grandes centros de venda de produtos medicinais de Cannabis. Em abril de 2024, a empresa publicou um artigo questionando a recusa de alguns estabelecimentos em vender seus produtos, mesmo sem regulamentações claras, que justifiquem tais decisões. Trata-se de uma dificuldade compartilhada pela maioria dos pequenos produtores, que ficam sujeitos às incertezas jurídicas. O ambiente inseguro é consequência da lei federal, que é ainda bem restritiva. Mesmo com o avanço das legislações estaduais, muitas empresas que possuem atuação nacional, como as instituições de crédito, não atendem a indústria de Cannabis, com receio de sanções.
COMO COMEÇOU
Os negócios das Irmãs do Vale começaram com a fundadora Christine Meeusen, que passou a se vestir como freira durante protestos contra a desigualdade e o tratamento da Cannabis medicinal nos Estados Unidos, por volta de 2010. Ela percebeu que o visual chamava atenção —e o usou como símbolo de cuidado, cura e autoridade espiritual. Rapidamente virou a Irmã Kate, proprietária de uma casinha, localizada em um terreno de 1.300 m², à margem da estrada de ferro de Merced, com 10 pés de maconha. Com a ajuda da sócia, Darcy Johnson, multiplicaram em 10 vezes a plantação. “Este é um ambiente selvagem”, diz a Irmã Darcy, responsável pelo e-commerce da marca, batizada de Etsy. “Não estamos cultivando dente de leão.” Nem as roupas de freira ajudam nesta instância.
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