Página Inicial Saúde ‘Achei que tinha matado meu bebê’: como psicose pós-parto pode virar do avesso a vida de novos pais – 11/05/2025 – Equilíbrio

‘Achei que tinha matado meu bebê’: como psicose pós-parto pode virar do avesso a vida de novos pais – 11/05/2025 – Equilíbrio

Publicado pela Redação

Importante: Esta reportagem contém detalhes que podem ser perturbadores para alguns leitores.

Ellie conta que, no início, se sentia totalmente exultante.

Ela teve seu parto em casa, sem analgesia, e estava radiante por ser mãe. E, mesmo com poucas horas de sono nos últimos três dias, ela decidiu que não precisava dormir.

“A melhor descrição que posso fazer é que parecia que eu tinha acordado de um pesadelo, sem saber o que era sonho e o que era realidade”, ela conta. “Mas [esta sensação] nunca desaparecia.”

“Depois, eu pensei que tinha matado meu filho na cama. Lembro que o meu parceiro apareceu e eu só perguntava ‘isso é real?'”

Ellie estava sofrendo de psicose pós-parto (PPP), uma doença debilitadora que pode temporariamente virar a vida do avesso para os novos pais.

O que é a psicose pós-parto?

Um dos primeiros sinais de alerta da PPP ocorre quando a mãe simplesmente não parece ser ela própria ou perde a noção de realidade.

A falta de sono é comum entre os pais logo após o parto. Mas a mulher com PPP pode parar de dormir por completo.

O Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS, na sigla em inglês) indica que os sintomas da PPP incluem:

  • Rápidas mudanças de humor
  • Alucinações
  • Culpa irracional
  • Ouvir vozes
  • Agitação
  • Confusão

A PPP é uma emergência médica e, na maioria dos casos, exige internação hospitalar para assistência e tratamento especializado.

Mas os especialistas afirmam que é fundamental lembrar que, por mais grave que pareça um episódio de psicose, a maioria das mulheres consegue se recuperar em questão de meses, com tratamento adequado.

Quais as causas da psicose pós-parto?

Mesmo após anos de pesquisas, ainda não sabemos ao certo o que causa a PPP.

Os médicos sugerem que alterações abruptas dos hormônios, verificadas durante o parto, podem ter alguma relação com a doença. Estas mudanças podem causar extrema confusão e paranoia.

Mas não existem formas confiáveis de prever quem será afetado, como exames de sangue, por exemplo.

Pelo menos a metade das novas mães diagnosticadas com PPP nunca havia sofrido psicose antes. Por isso, elas sofrem alucinações totalmente desconhecidas e assustadoras.

Para Ellie, o início da PPP foi rápido.

“Fico, agora, imaginando se ela não terá começado quando eu estava ativa em trabalho de parto, à noite, por horas em casa”, ela conta. “Por alguma razão, decidi só acordar meu marido às seis horas da manhã.”

A PPP afeta entre e uma e duas a cada 1 mil mulheres após o parto. Ela é muito menos comum que a depressão pós-natal, que atinge cerca de uma a cada 10 novas mães.

Especialistas acreditam que mais mulheres sofrem de PPP do que se calculava anteriormente.

A própria depressão pós-natal grave passou anos minimizada como se fosse “tristeza do parto”. Mas os médicos alertam que esta postura em relação à saúde mental pode dificultar muito o acesso dos pais a tratamento adequado.

Pesquisas empíricas da organização britânica Ação sobre a Psicose Pós-Parto (APP) indicam que ainda é comum que as mulheres recebam diagnósticos errados, talvez por médicos ou parteiras comunitárias, que podem sugerir o uso de comprimidos para dormir.

Organizações como a APP, o australiano COPE (Centro de Excelência Perinatal, na sigla em inglês) e a neozelandesa Ansiedade e Depressão Perinatal Aotearoa (PADA, na sigla em inglês) trabalham para conscientizar o público em geral e os profissionais da linha de frente da saúde sobre a PPP.

Ellie, agora, trabalha para uma entidade que apoia mães com PPP. Para ela, alguns fatores levaram à crise, como a falta de sono e a imensa pressão para ser uma mãe perfeita. Mas ela já sabe que estava em um grupo de risco muito mais alto, por sofrer de transtorno bipolar do tipo 1.

Cerca de 25% das mulheres com este transtorno terão um episódio com gravidade suficiente para precisarem de assistência hospitalar após seu primeiro filho, segundo pesquisa da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, publicada na revista The Lancet.

No Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia, as mulheres deste grupo, agora, são aconselhadas a manter a medicação. Há alguns anos, os médicos da família indicavam sua suspensão, o que ainda é frequentemente aconselhado em outros países.

As mulheres nesta situação precisam consultar um psiquiatra perinatal especializado, segundo a APP e diversas outras organizações.

Pesquisas do chefe de psiquiatria perinatal de Cardiff, Ian Jones, indicam que, aparentemente, não há aumento de risco de psicose pós-parto entre pessoas com histórico de traumas na infância.

Ele destaca que isso fortalece sua ideia de que existe um elemento biológico envolvido na PPP e os picos hormonais parecem ser um dos principais fatores que levam a esta condição.

O que pode ajudar?

Existe o risco de que, sem tratamento, as mães com PPP possam tentar se ferir, segundo diversas pesquisas.

Estudos clínicos realizados no Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia concluíram que o melhor tratamento da PPP é manter as mães com seus bebês em unidades psiquiátricas para mães e bebês, em observação rigorosa.

Esta técnica apresenta alto índice de sucesso, mas conseguir uma vaga pode ser uma loteria, pois existem muito poucas unidades e leitos disponíveis.

Também há unidades especializadas na França e na Bélgica.

“Para mim, parecia mais que ‘uma chave’ havia sido desligada no meu cérebro e era muito óbvio”, conta Ellie.

Ela tem falhas de memória, mas se lembra de ficar de pé no alto da escada, em casa, ouvindo seu marido ligar para a enfermaria da maternidade local.

“Fiquei muito assustada”, relembra ela. “Eu precisava de ajuda e, como eles me ouviram gritando, a parteira-chefe lutou para que eu fosse para uma MBU [unidade psiquiátrica de mãe e bebê, na sigla em inglês]. O mais importante é que ela mantém você bem, este é o foco principal.”

A porta-voz da organização australiana sem fins lucrativos Centro de Excelência Perinatal, Ariane Beeston, sofreu PPP. Ela destaca que estes leitos são uma necessidade fundamental.

Beeston trabalhou anteriormente em proteção infantil. Para ela, a PPP surgiu absolutamente do nada.

No seu livro Because I’m Not Myself, You See (“Porque não sou eu mesma, entende”, em tradução livre), ela descreve alucinações com dragões ao lado do seu filho e drones do governo voando sobre sua cabeça.

Depois de ser finalmente internada em uma unidade psiquiátrica para mães e bebês, ela recebeu o apoio necessário para conseguir dormir o suficiente, formar laços com seu novo filho, participar das aulas de preparação para os pais e se recuperar.

Beeston conta que a experiência a transformou profundamente.

Um dos momentos mais difíceis para as mulheres poderem sair das MBUs é decidir, com sua equipe de assistência, qual é o momento certo para voltar para casa.

A decisão de amamentar ou não também é importante para as mulheres com risco mais alto. É preciso entender como irá funcionar com a medicação de uso contínuo, segundo a pesquisadora Clare Dolman, do King’s College de Londres.

O acesso a este tipo de assistência pode ser extremamente limitado em outros países. Existem profundas diferenças socioculturais em todo o mundo em relação às mulheres que são mães pela primeira vez.

Algumas culturas ainda impõem 40 dias de confinamento após o parto para as novas mães. E, em algumas partes da Índia, a PPP ainda é explicada como um destino religioso —”devva hididide”, ser possuída por um fantasma.

Em outras culturas, os transtornos de saúde mental pós-parto podem ser considerados deficiência pessoal ou fracasso como mãe.

Em Hong Kong, pesquisadores encontraram mães sob pressão para desempenhar o papel materno tradicional. Qualquer falha pode ser considerada uma vergonhosa perda de prestígio.

O que acontece se você quiser outro bebê?

Uma em cada duas mães que sofrem de PPP, infelizmente, passa novamente pela mesma experiência nos partos seguintes, segundo pesquisa da Universidade de Manchester e Cardiff, no Reino Unido.

Para as mães que têm mais filhos, pesquisas descrevem que o planejamento prévio detalhado pode garantir que haja mais apoio à sua disposição, seja tendo amigos e familiares em prontidão para ajudar, priorizando o sono e, basicamente, tentando “se colocar em primeiro lugar, para ser uma boa mãe”, segundo Ellie.

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