Página Inicial Saúde Bobbie Goods pode relaxar, mas não é terapia – 17/06/2025 – Equilíbrio

Bobbie Goods pode relaxar, mas não é terapia – 17/06/2025 – Equilíbrio

Publicado pela Redação

Se você é cronicamente online, provavelmente já se deparou com os cachorrinhos e ursinhos fofos sendo coloridos por canetinhas em vídeos na internet. Os livros de colorir Bobbie Goods, da editora Harper Collins, não são um fenômeno tão novo, mas seguem em alta.

O hobby pode ser uma ideia para quem busca um tempo fora das telas e a sensação de relaxamento e bem-estar. Especialistas dizem que, por mais que a atividade seja capaz de gerar satisfação, a comparação, autocobrança e até mesmo o fazer pelo modismo podem causar o efeito reverso.

Ana Carolina Souza, doutora em neurociências pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e sócia da Nêmesis Neurociência Organizacional, explica o efeito que a coloração e os hobbies manuais têm no nosso cérebro.

“A concentração ajuda no relaxamento. Essas atividades, sendo de baixa demanda, não dinâmicas, e que não sejam energizantes, têm efeito calmante”, afirma. “É diferente de ficar assistindo milhões de vídeos com muitos estímulos.”

Segundo ela, colorir —que trabalha a coordenação motora fina— faz com que os movimentos do corpo estejam mais relaxados. Esse processo faz com que o nosso corpo libere dopamina de uma forma mais saudável.

“A gente fala muito de resposta dopaminérgica e de vício em dopamina. Isso acontece com coisas feitas rápido e que têm uma resposta curta no cérebro, levando ele a se acostumar com aquilo. Aí eu preciso cada vez mais daquilo para aquele prazer voltar a acontecer”, afirma a neurocientista.

Já os hobbies offline, como os livros para colorir, fazem com que seja necessário um processo de conclusão. Ou seja, demanda um desafio, concentração e tempo, que trazem um padrão de superação e motivação, como colocado por Souza.

“Isso está mais ligado à felicidade eudaimônica, que é aquela que você tem um investimento, um esforço, para ter o prazer e satisfação. Está na sua motivação, vem de dentro de você. É diferente se a pressão vem de fora”, fala.

Marcos dos Reis Nogueira, presidente da Associação de Arteterapia do Estado de São Paulo (AATESP) afirma que as formas manuais de trabalhar trazem um relaxamento, assim como outros trabalhos manuais não necessariamente artísticos. “Eles trazem, de certa forma, um bem-estar, uma calma, uma tranquilidade, um centramento.”

O cabeleireiro Douglas Rossi, 32, começou a colorir os livros Bobbie Goods há um mês e meio e tem três livros diferentes e 280 canetas. “Eu realmente esqueço de tudo enquanto estou pintando. Não mexo no celular, não lembro de ninguém. Desfoco dos meus problemas”, conta.

Ele diz que consegue ficar cerca de quatro horas na atividade, porque gosta de se atentar aos detalhes. Perfeccionista, ele acaba se frustrando por não conseguir reproduzir os efeitos que vê nas redes sociais, mas isso o motiva a continuar tentando até conseguir.

“Me faz muito bem conseguir superar a dificuldade, me motiva a pintar cada vez mais”, comemora. Ele assiste aos vídeos para se inspirar na combinação de cores —o motivo de tantas canetas—, mas também cria as suas próprias, que são as que mais trazem a sensação de bem-estar para ele.

Rossi afirma que ficou muito mais calmo depois que começou os desenhos. “Até minha mãe falou”, diz. Ele se considera uma pessoa ansiosa e diz acreditar que os livros realmente o acalmam, até mesmo quando não está colorindo. “Estou tendo mais paciência com tudo.”

No entanto, o arteterapeuta Marcos dos Reis Nogueira lembra que, por mais calmante que possa parecer, esse processo de colorir por si só não é arteterapia. Ele explica que a arteterapia é um processo de análise, feito com acompanhamento de um profissional formado para isso, que usa a arte como uma ferramenta para o que não consegue ser acessado por meio da fala.

“Aquele símbolo produzido, aquela imagem, passa para uma análise junto com o arteterapeuta. A gente vai entender os significados por trás daquela produção, os traumas”, além de desenvolver habilidades para lidar com as questões psicológicas.

Agora se, por outro lado, você engaja na atividade por querer pertencer a um determinado grupo, ou simplesmente porque é a moda do momento, a pressão, a cobrança e a comparação podem fazer com que o hobby se torne uma fonte de ansiedade e frustração.

“A gente pode cair nesse padrão mesmo sem querer, porque para nós pertencer é muito importante”, explica Souza. “Isso acontece também se você cria um nível de dificuldade muito grande e se compara com as pessoas nas redes sociais.”

A neurocientista lembra que, se há a comparação com as redes sociais, a atividade acaba fugindo de seu princípio de ser uma atividade desconectada, longe de telas. Isso faz também com que seja diferente assistir aos vídeos de pessoas colorindo e de fato produzir algo.

Nogueira explica que é porque o processo da arte exige criatividade e desafio. “Trabalhar com as cores, os materiais, a argila, os pincéis vai afetar aquela pessoa, trazendo para ela benefícios que vão durar para vida toda.”

Ele reforça que quando ficamos apenas nas telas, sem colocar a mão na massa para elaborar, criar, brincar e imaginar, corremos o risco de nos tornarmos humanos menos criativos.

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