Talvez porque eu já tenha uma restrição com o álcool, detesto que venham me pedir para restringir mais alguma coisa. Ultimamente tenho comido ferozmente todo tipo de doce, em especial chocolate. “Alice, você percebe que está exagerando?”, diz minha mãe. Por causa do comentário, acabo me esbaldando ainda mais.
E pior: também tenho percebido que escondo as embalagens. Igualzinho fazia com as garrafas.
Outro dia fui calçar uma bota e achei dois invólucros amassados dentro dela. Comecei a achar isso muito doentio e passei a ficar com uma aflição louca. Por que não jogo no lixo? Por que guardo tudo, para depois ir encontrando e contando quantas unidades comi?
Não tem nenhum problema estar numa fase mais formiguinha, só que me preocupo com esse comportamento. Imediatamente faço uma analogia com o álcool. Chamamos de comportamento da ativa.
Já contei dos inúmeros esconderijos que usava para esconder garrafas, tampinhas e latinhas de bebida. É maluco. E estou fazendo o mesmo com o chocolate. Não quero que ninguém veja a quantidade que comi e por isso vou pondo embaixo da cama, nas gavetas.
“Se você quiser emagrecer um pouco, tem que cortar o doce”, disse outro dia minha irmã. Fico com raiva, pois ela pode tomar quantas taças quiser e ninguém fica falando que engorda. Francamente. A Cris, minha professora de ginástica, também fica horrorizada quando eu digo que tomo Coca-Cola quase todos os dias. “Ai, Alice, toma água, suco… bem melhor.”
Estou há mais de cinco anos sem beber, tempo mais do que suficiente para me acostumar à nova vida e mudar meus hábitos alimentares. Falo isso porque, nos primeiros meses em recuperação, não dava nem para pensar em tirar mais alguma coisa da dieta. Estava tudo liberado. Mas hoje não penso que essa tolerância ainda seja válida.
Se na ativa eu era da noite, sem beber eu passei a apreciar mais o dia. Acordar cedo, dormir cedo, tomar café da manhã, me alimentar em todas as refeições. Tomar banho todos os dias, lavar a cabeça, organizar minha casa, cuidar de plantas, não faltar no trabalho. Viver sem mentir. Comer doces em geral. E não acender a luz quando está dia.
Na ativa quase não comia açúcar. Já viu alguém tomando uma cervejinha com um pedaço de bolo de chocolate? O doce corta o sabor da bebida e o efeito também. Assim como o café, que eu não podia ver na frente. Lembro que algumas vezes me forçavam a tomar café quando estava de porre, para ver se cortava o efeito do álcool.
O problema hoje não é que chocolate engorde, embora isso me preocupe. Também não é que a quantidade possa me fazer mal, afinal só estou nesse ritmo há pouco mais de um mês. A questão é o comportamento. Sou capaz de negar que esteja comendo tanto chocolate. E também posso acordar no meio da noite para comer sem que ninguém veja. Ou levar uma barrinha ao banheiro para poder comer sem testemunhas. Tudo isso me deixa com a antena ligada.
O bom é que tenho consciência, percebo que algo não está legal. Não tem nada pior do que a negação. Sei que o chocolate está me seduzindo demais, mas também sei que isso não é bom. Então me proponho a mudar. O chocolate, afinal de contas, enjoa e não me faz perder a memória.
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