Página Inicial Saúde Comparar, para um alcoólatra, atrapalha a recuperação – 28/07/2025 – Vida de Alcoólatra

Comparar, para um alcoólatra, atrapalha a recuperação – 28/07/2025 – Vida de Alcoólatra

Publicado pela Redação

Parece que já escrevi isso muitas vezes, porém é necessário repetir: ser uma alcoólatra em recuperação é uma condição que carrega dor, vergonha, mas também coragem. Coragem não só de assumir minhas fraquezas, mas de lutar incessantemente por uma vida mais digna e consciente. No entanto, há sempre os obstáculos nessa trajetória. São desafios internos, e um dos principais é a comparação.

Vivemos em um mundo que valoriza o “perfeito”. Um mundo onde as pessoas procuram mostrar o melhor de si o tempo todo, especialmente nas redes sociais. As fotos são sorridentes, os corpos são bonitos, os relacionamentos parecem sempre estáveis, as conquistas sempre estão em destaque. Mas por trás disso, existe muito que não é dito: medos, dores, frustrações, vícios e crises existenciais. Tudo isso fica escondido, fora do alcance dos olhos dos outros.

E quando eu olho para essas vitrines digitais, me sinto pequena. Me comparo. Me sinto atrasada e insuficiente. Às vezes me questiono: “Por que os outros conseguem e eu não?”. Ou: “Por que minha vida parece travada enquanto a dos outros avança?”. Essa comparação me rouba a paz. E, mais do que isso, me afasta da minha verdade. Porque ela se baseia em uma ilusão: a de que a vida dos outros é melhor, mais fácil, mais tranquila, quando, na verdade, todos carregam dores que não aparecem em fotos.

A comparação não só me machuca, como também atrapalha minha recuperação. Ela me desvia do que realmente importa: de mim. Em vez de olhar para o meu progresso, acabo olhando para o que não sou ou não tenho. E isso pode ser perigoso. Pode acionar gatilhos, gerar sentimentos de inadequação, alimentar a vontade de fugir. E na comparação eu estou sempre em desvantagem, olho para o que os outros têm que eu não tenho. Nunca ao contrário. Não penso nas milhares de pessoas que não têm muitas coisas que tenho. Em relação à recuperação, por exemplo, eu estou há anos sem beber e vivo um processo de autoconhecimento. Quantas pessoas conseguem?

Mas estou aprendendo com terapia, com partilhas em grupo, com o tempo, que a única comparação justa é comigo mesma. Olhar para trás e perceber o quanto evoluí. Que o fato de estar sóbria hoje, de ter dito “não” para um copo, é uma vitória imensa, mesmo que ninguém veja ou reconheça. E que estar limpa não significa ser perfeita, mas continuar tentando, mesmo quando tudo dentro de mim pede para desistir.

Se a comparação com o outro quase sempre nos diminui, quando feita com a nossa trajetória pode ser um lembrete de força. Eu não sou menos porque erro. Eu não sou inferior porque luto. A minha dor não me faz menor, me faz humana.

Hoje tento viver um dia de cada vez. Tento me afastar de tudo que supostamente o mundo impõe. Tento enxergar o que há de real em mim —minhas falhas, mas também minha coragem, minhas vitórias. Porque ser alcoólatra em recuperação é, antes de tudo, ser alguém que escolheu viver. E isso, por si só, já vale mais do que qualquer comparação.


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