O secretário de saúde americano Robert F. Kennedy Jr. nomeou na quarta-feira (11) oito médicos e pesquisadores, incluindo quatro que se manifestaram contra a vacinação de alguma forma, para substituir alguns dos membros que ele demitiu de um painel de especialistas que aconselha Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês).
Kennedy fez o anúncio na quarta-feira na plataforma social X, dois dias depois de demitir todos os 17 membros do Comitê Consultivo sobre Práticas de Imunização. A repórteres, o secretário de saúde disse aos repórteres que as demissões “já estavam previstas há muito tempo”.
Kennedy disse no X que suas escolhas incluíam “cientistas altamente credenciados, principais especialistas em saúde pública e alguns dos médicos mais realizados da América”. Em uma publicação na noite de terça-feira, um dia após remover os membros do painel, Kennedy prometeu que não nomearia “anti-vacinadores ideológicos”.
Após a divulgação da nova lista, especialistas em doenças infecciosas e vacinas imediatamente acusaram o secretário de saúde de quebrar sua palavra. Quando Kennedy demitiu todo o comitê, conhecido como ACIP, ele citou conflitos financeiros de interesse e disse que uma limpeza completa era necessária para restaurar a confiança pública na vacinação.
Mas um funcionário da Casa Branca e uma pessoa próxima a Kennedy disseram na terça-feira que a ideologia também estava em jogo. Além dos supostos conflitos financeiros, Kennedy estava preocupado que todos os membros tivessem sido nomeados pelo ex-presidente Joe Biden, e que alguns tivessem feito doações aos Democratas. A revelação foi chocante para líderes de saúde pública, que afirmam que os conselheiros científicos são escolhidos por sua expertise, sem consideração de filiação partidária.
“O maior golpe aqui é a ironia dele, RFK, falando sobre recuperar a confiança do público”, diz Paul Offit do Hospital Infantil da Filadélfia, que serviu como membro do comitê e frequentemente se desentendeu com Kennedy.
“O que ele acabou de fazer foi perder a confiança da comunidade médica”, acrescenta Offit, “tanto que as pessoas estão pensando: ‘Deveríamos tentar criar nosso próprio ACIP, nosso próprio comitê consultivo de vacinas?’ Porque não se pode confiar neste.”
Os oito membros nomeados por Kennedy —sete homens e uma mulher— têm credenciais variadas. Todos são médicos ou possuem doutorado. Incluem um psiquiatra; um bioestatístico; um especialista em análise de saúde; um bioquímico; um pediatra; um médico de emergência; uma enfermeira de saúde pública e cuidados intensivos; e um obstetra.
Richard H. Hughes IV, que ensina direito de vacinas na Faculdade de Direito da Universidade George Washington, destacou um dos novos membros do comitê —Cody Meissner— como um “vacinologista legítimo”. Meissner, professor de pediatria em Dartmouth, ocupou anteriormente cargos consultivos tanto no CDC quanto na Administração de Alimentos e Medicamentos. Offit e outros especialistas elogiaram Meissner por seu profundo conhecimento sobre vacinas.
Hughes disse que três dos novos membros são “médicos legítimos” que “não têm expertise discernível” em imunologia ou vacinas. Mas ele caracterizou os quatro restantes como “negacionistas da Covid, céticos e indivíduos abertamente anti-vacina”.
De longe, a escolha mais polêmica, e a de maior perfil, é Robert Malone. Ele desempenhou um papel inicial na pesquisa de mRNA e afirmou ser o inventor da tecnologia. Ele se tornou uma estrela da direita após uma aparição em 2021 no “The Joe Rogan Experience” que expôs ele e Rogan a críticas de que teriam espalhado desinformação. Malone foi um crítico vocal da resposta à Covid da administração Biden.
“Malone tem um histórico bem documentado de promover teorias da conspiração e tratamentos não comprovados como ivermectina e hidroxicloroquina para Covid”, diz Jeffrey D. Klausner, epidemiologista e especialista em doenças infecciosas da Universidade do Sul da Califórnia.
Klausner, que também é vizinho de Kennedy em Los Angeles e conversou com o secretário de saúde sobre possíveis candidatos para comitês consultivos, afirma estar “decepcionado” com a nomeação de Malone, que ele disse ser provavelmente “uma jogada política para manter o apoio de alguns americanos e demonstrar diversidade, equidade e inclusão”.
Martin Kulldorff, um bioestatístico sueco e ex-professor da Universidade Harvard, tem sido geralmente favorável às vacinas e aconselhou o CDC sobre segurança de vacinas. Mas ele se opôs aos mandatos de vacina contra Covid e à vacinação contra Covid para crianças, e se envolveu na política da pandemia em 2020 como autor principal da Declaração de Great Barrington, um documento que se opunha aos lockdowns.
A declaração, cujos autores principais também incluíam Jay Bhattacharya, diretor dos Institutos Nacionais de Saúde, reuniu quase 1 milhão de assinaturas de mais de 40 países. Meissner, o novo membro do ACIP, foi um dos primeiros signatários. Mas isso provocou uma intensa reação negativa do Dr. Anthony Fauci e outros líderes de saúde pública, que a classificaram como perigosa.
Enquanto Malone e Kulldorff são os mais conhecidos dos novos membros, outras duas escolhas —Retsef Levi e Vicky Pebsworth, uma enfermeira— também provavelmente serão alvo de escrutínio por parte dos líderes de saúde pública.
Levi, especialista em análise, gestão de riscos e sistemas de saúde no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, criticou o fechamento de escolas e lockdowns da Covid, e alertou contra vacinas de mRNA.
Pebsworth, que tem doutorado em saúde pública, faz parte do conselho do Centro Nacional de Informação sobre Vacinas, fundado em 1982 para promover a conscientização sobre os riscos da vacinação. Ela serviu como representante dos consumidores em um painel de especialistas que aconselha a FDA sobre vacinação e aconselhou o governo em outras capacidades.
Em seus primeiros anos, o centro de informação sobre vacinas trabalhou com autoridades federais para promover a segurança das vacinas e criar um sistema para lidar com lesões causadas por vacinas. Mas hoje, os defensores da vacinação o consideram um grupo anti-vacina.
A biografia de Pebsworth no site do centro diz que ela é mãe de uma criança lesionada por vacina. “Seu filho —seu único filho— experimentou problemas de saúde graves e de longo prazo após receber sete vacinas de vírus vivo e bactérias mortas administradas durante sua consulta de bem-estar aos 15 meses, o que despertou seu interesse em pesquisa e formulação de políticas de segurança de vacinas, e doenças crônicas e deficiências em crianças”, diz o site.
Não está claro como o comitê avançará com uma composição totalmente nova. Sua próxima reunião está marcada para o final deste mês. Os membros do comitê esperavam discutir, entre outras coisas, uma mudança no cronograma de vacinação para a vacina contra o papilomavírus humano, mas não parece haver uma agenda no site do comitê.
“Este é um comitê constituído de forma muito diferente do que tínhamos antes”, diz Yvonne Maldonado, pediatra e professora da Universidade Stanford, que estava entre os membros demitidos na segunda-feira. Ela previu que seria “muito difícil percorrer a agenda de maneira tranquila”, dado que o novo painel terá apenas duas semanas para se preparar.