Após mais de um mês de campanha de vacinação contra o sarampo na cidade de São Paulo, voltada para bebês de seis meses a menos de um ano de idade, algumas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) enfrentam desabastecimento da chamada “dose zero”. A estratégia foi lançada para reforçar a imunidade desse público mais vulnerável diante de um surto da doença nos Estados Unidos e do registro de alguns casos no Brasil.
A vacinação contra o sarampo faz parte do PNI (Programa Nacional de Imunizações) do Ministério da Saúde e é recomendada para áreas com grande circulação de pessoas vindas de outros países, como os Estados Unidos.
A reportagem identificou desabastecimento unidades da zona oeste, leste, norte e contro de São Paulo. Na zona oeste, funcionários da UBS Vila Romana disseram que a vacina acabou na semana passada, sem previsão de reposição. Situação similar ocorre na UBS Vila Anastácio, que não dispõe da dose para a dupla viral de sarampo, e na UBS Alto de Pinheiros, que possui apenas a tríplice viral.
Na zona leste, a UBS Cidade Kemel não possui a dose zero desde o início da semana. Segundo a unidade, a vacina esgotou nos municípios vizinhos, o que faz com que moradores da região buscassem a unidade para aplicar a dose. Também não tem previsão para reposição.
No centro, a UBS da Sé não possui a dupla viral para bebês a partir de seis meses, disponibilizando apenas a tríplice. Situação semelhante ocorre na UBS Casa Verde, na região norte da cidade.
A Secretaria Municipal de Saúde afirma que a Coordenadoria de Vigilância em Saúde (Covisa), por meio do Programa Municipal de Imunizações (PMI), adota medidas para garantir o abastecimento de vacinas na rede municipal. A distribuição e o fornecimento das vacinas seguem diretrizes técnicas do PNI e do Plano Estadual de Imunização (PEI).
A pasta também disse que o município realiza o remanejamento de estoques entre as UBSs das diferentes regiões de forma contínua para manter a oferta à população. Afirmou ainda que aguarda o envio de novas doses pela Secretaria de Estado da Saúde (SES).
O Governo de São Paulo afirmou que recebeu do Ministério da Saúde 154 mil doses do imunizante no dia 9 de junho e distribuiu 43% deste total para a cidade de São Paulo. Diz ainda que a recomendação da dose zero para a população de 6 a 11 meses ocorre nas regiões da Grande São Paulo, Região Metropolitana de Campinas e Baixada Santista, conforme nota técnica do PNI.
“Segundo o órgão federal, está prevista para a próxima semana uma nova remessa do imunizante para o estado de São Paulo”, afirma a SES.
O Ministério da Saúde foi procurado para comentar a falta de vacinas contra sarampo em São Paulo, mas não retornou até a publicação deste texto.
Apesar da campanha para a aplicação do imunizante, a dose zero não substitui as doses do calendário de rotina, que devem ser aplicadas aos 12 e 15 meses de idade. A imunização contra o sarampo é feita em esquema de duas doses: a dupla viral, que cobre rubéola e sarampo, e a tríplice viral, que também protege contra caxumba.
Especialistas ouvidos pela Folha explicam que o motivo de a dose zero não substituir as doses do calendário é que, nessa fase, o bebê ainda pode ter anticorpos transmitidos pela mãe durante a gestação. Esses anticorpos podem interferir na ação da vacina, fazendo com que ela não funcione adequadamente.
Cenário epidemiológico
Neste ano, o Brasil voltou a apresentar casos autóctones (com transmissão interna) da doença após quase três anos sem registros. Em março, dois casos foram notificados em São João de Meriti, no Rio de Janeiro. Em abril, São Paulo registrou o primeiro caso.
Os casos não comprometem o status do Brasil como país livre da circulação dos vírus de sarampo, rubéola e Síndrome da Rubéola Congênita, certificado pela Opas (Organização Pan-Americana da Saúde) em novembro de 2024. Foi a segunda vez que o Brasil recebeu tal certificado. O primeiro foi concedido em 2016, mas perdido em 2018 após a reintrodução do vírus no país e novos surtos da doença.