A MP (Medida Provisória) que cria o “Agora Tem Especialistas” permite ao Ministério da Saúde agir diretamente em estados e municípios para reduzir a fila do SUS.
O texto assinado nesta sexta-feira (30) pelo presidente Lula (PT) rompe com a lógica vigente desde a criação do Sistema Único de Saúde, na qual o Ministério da Saúde atuava principalmente transferindo recursos para secretarias locais de saúde executarem os serviços.
Agora, o ministério poderá contratar hospitais e clínicas em todo o país.
O ministro Alexandre Padilha (PT) afirma que a investida do ministério deve durar até 36 meses e não significa uma intervenção do governo federal. “Essa experiencia vai ajudar a consolidar o quanto que a União pode entrar em campo em apoio aos estados e municípios”, disse o ministro.
A MP insere um dispositivo na lei de criação do SUS prevendo que a União, “em situação de urgência em saúde pública” causada pela alta demanda na atenção especializada, pode contratar e prestar serviços nos estados e municípios.
Ainda que o texto não tenha recebido críticas públicas de entidades ligadas ao SUS, gestores locais ouvidos sob reserva pela Folha dizem que não tiveram acesso ao texto antes da publicação. As linhas gerais da mudança foram apresentadas durante a semana por Padilha em reuniões com o Conass e Conasems, conselhos que representam secretários de saúde de estados e municípios.
Nestes encontros, o ministro disse o governo não abrirá uma competição com prefeitos e governadores sobre quem oferece os melhores atendimentos. Padilha também tem afirmado que os serviços contratados pelo ministério serão distribuídos conforme a demanda apresentada pelos gestores locais.
Na próxima semana, as equipes técnicas do ministério e dos gestores do SUS devem se reunir para finalizar portarias e outras normas ligadas ao programa.
Em entrevista à imprensa após a assinatura da medida provisória, o ministro disse que o governo federal não vai “criar uma fila própria, um encaminhamento próprio”.
Ele afirmou que havia receio parecido de o ministério ultrapassar os seus limites de atuação quando foi lançado o Mais Médicos, em 2013, pois os profissionais seriam contratados pela União, mas atuariam em serviços municipais.
Na mesma fala, o ministro disse que existe a “necessidade de arranjos que às vezes ultrapassam território do município ou do estado para ampliar oferta de atendimento de consultas e exames”.
“É uma necessidade identificada por todos nós”, afirmou.
O Ministério da Saúde ainda deve editar uma portaria detalhando as atividades que serão feitas neste período de “urgência em saúde pública”. Padilha afirmou que a atuação direta do governo federal deve ser feita inicialmente em 24 meses, podendo ser prorrogada por mais 12 meses.
“Toda iniciativa do Ministério da Saúde que venha a contribuir para ampliar a assistência em saúde do SUS nos estados será bem-vinda. Apenas ressalto que é imprescindível um entendimento prévio com o Conass e Conasems para que as pactuações regionais não sofram interferências que comprometam o desempenho das iniciativas já em curso”, disse o secretário de saúde do Mato Grosso, Gilberto Figueiredo, que também é vice-presidente do Conass.
Figueiredo disse que os secretários conheceram “superficialmente” o texto antes da publicação.
Padilha afirma que a ideia da MP é mobilizar toda a rede de atendimento pública e privada para reduzir o tempo de espera por procedimentos especializados no SUS.
O ministro afirma que irá mobilizar R$ 16 bilhões na ação, sendo que a maior parte da verba já integra o orçamento do ministério. Neste montante, cerca de R$ 4,4 bilhões são de troca de dívidas de empresas de saúde por serviços ao SUS.
O ministério deve abrir duas frentes para essa troca. Um dos caminhos é permitir que operadoras de planos de saúde abatam dívidas de ressarcimento ao SUS. A segunda forma é com a emissão de créditos para hospitais privados e filantrópicos descontarem os valores faturados nos serviços diretamente nos seus débitos tributários ou das futuras cobranças de impostos.
Como a Folha mostrou, a Saúde quer que os hospitais privados contratados tenham de expor a marca da iniciativa, a exemplo do que ocorre em ações como o Farmácia Popular. O slogan do programa também será apresentado em veículos comprados pelo governo federal para transporte de pacientes, além de carretas adaptadas para atendimentos.
O programa contempla consultas, exames e cirurgias de ginecologia, oncologia, cardiologia, oftalmologia, otorrinolaringologia e ortopedia. O eixo principal da primeira versão da política, que era chamada Mais Acesso a Especialistas, mantém-se: o governo prevê o repasse mais alto de recursos para estados e municípios promoverem uma série de consultas e exames especializados em prazo mais curto, como até 60 dias.
O governo agora quer reforçar esse ciclo levando pacientes do SUS para a rede privada. O plano também passa por estimular que municípios ampliem horários de atendimento.