Página Inicial Saúde Idosos belgas vão à balada para combater a solidão – 24/06/2025 – Equilíbrio

Idosos belgas vão à balada para combater a solidão – 24/06/2025 – Equilíbrio

Publicado pela Redação

Era bem depois da meia-noite em um fim de semana recente, e a casa noturna Mirano, no centro de Bruxelas (Bélgica), pulsava com sua energia habitual. Um DJ tocava música com graves pesados e um toque da África Ocidental, pessoas tomavam drinques no bar e luzes vermelhas iluminavam uma pista de dança lotada.

Entre os foliões de croppeds, saias curtas e saltos altos, um grupo se destacava: residentes de casas de repouso de cabelos grisalhos, muitos na casa dos 80 ou 90 anos de idade. Os homens vestiam ternos com lenços no bolso, e as mulheres, de rímel e batom vermelho, usavam colares volumosos e blusas com lantejoulas.

“Olhe a atmosfera”, dizia Guillaume Vanderweyen, 99, que estava em uma balada pela primeira vez em 40 anos. “Todo mundo está feliz porque estamos fazendo algo diferente. Isso importa na vida.”

Ele ficaria dançando até depois das 2h da manhã. Ele admitiu que não estava tão ágil como costumava ser, mas, graças aos exercícios diários, parecia não ter dificuldade em se curvar e girar ao som das músicas de Rihanna e do cantor nigeriano Kizz Daniel.

Vanderweyen, um carpinteiro aposentado, e outros 15 residentes de casas de repouso de Bruxelas estavam na casa noturna em um passeio organizado pela Papy Booom, uma organização sem fins lucrativos belga que busca combater a solidão entre os idosos e criar mais oportunidades de diversão.

Até 2050, a proporção de pessoas com 85 anos ou mais na União Europeia mais que dobrará, segundo estimativas do bloco, e a Bélgica é um dos muitos países onde a idade média está aumentando. Com as pessoas vivendo mais do que nunca e o isolamento social em ascensão, muitos na Europa e em outros lugares estão se perguntando: como a qualidade de vida dos idosos pode ser melhorada?

Youssef Kaddar, diretor da Papy Booom —nome inspirado em um termo francês que se refere ao envelhecimento da população do baby boom pós-Segunda Guerra Mundial— costumava organizar eventos mais convencionais para idosos, como viagens à beira-mar e saídas para restaurantes. Mas essas atividades começaram a parecer ultrapassadas. Ele se perguntou se haveria interesse em algo um pouco mais ousado.

Surpreendentemente, sim. Ele organizou cinco saídas para casas noturnas desde 2023, com ótimas avaliações, e também organizou passeios de balão, noites de videogame e festas diurnas.

Um dos objetivos é incentivar a interação entre diferentes faixas etárias, o que a OMS (Organização Mundial da Saúde) diz ser fundamental para envelhecer bem —e que aconteceu com frequência na casa noturna em Bruxelas. Kaddar, 37, também tenta prevenir o que ele chama de “desvanecimento do espírito” que pode acontecer à medida que as pessoas envelhecem.

“Estamos em um lar de idosos, mas a vida não para”, disse. “É uma nova vida que vai começar.”

Em um sábado à noite, moradores de diversas casas de repouso se reuniram em uma delas para um jantar às 17h30. Várias das mulheres fizeram cabelo e maquiagem, uma escolheu uma sombra azul. Por volta das 20h30, o grupo seguiu para um restaurante para as sobremesas. Uma pequena festa dançante começou quando a música “Alexandrie, Alexandra”, de 1977, do cantor pop francês Claude François, começou a tocar.

Então, por volta das 23h, o grupo, acompanhado por dois voluntários da Papy Booom e seis funcionários das casas de repouso, entrou nos corredores espelhados do Mirano, uma casa noturna pouco iluminada que tem sido um ponto fixo da vida noturna de Bruxelas desde os anos 1980.

Em minutos, vários deles estavam se movimentando na pista de dança, enquanto garçons serviam garrafas de champanhe Moët & Chandon com faíscas saindo do topo. O Mirano, como os outros clubes que participaram, não cobrou do grupo ou da equipe pela noite; a Papy Booom, que é financiada por governos nacionais e locais e doações privadas, pagou pelas sobremesas.

Thérèse Troch, 85, disse que não era muito festeira quando era mais jovem. Seu gênero musical favorito é o clássico. Mas ela decidiu se juntar ao grupo para sair da bolha da casa de repouso.

“É a possibilidade de estar em contato, de não falar apenas com idosos”, disse Troch, ex-professora de ioga. “Porque é sempre a mesma coisa. ‘Ah, meu reumatismo!’ E coisas do tipo.”

Ainda assim, a realidade da velhice indicava que havia alguns desafios na balada. Aparelhos auditivos tiveram que ser removidos por causa do som alto. Alguns residentes usavam bengalas ou estavam se recuperando de fraturas no quadril. Idas ao banheiro, descendo uma escada escura, exigiam assistência de membros da equipe de segurança.

Em um momento baixo da noite, uma integrante do grupo perdeu brevemente a consciência depois de beber demais. Uma ambulância a levou para um hospital, onde ela passou a noite, e estava se sentindo melhor no dia seguinte, contou Kaddar. Ele disse que nada parecido havia acontecido antes.

‘Uma cura barata’

Alguns jovens pareciam surpresos e riam quando entravam na casa noturna e viam o grupo mais velho em uma cabine próxima à pista de dança.

Uma frequentadora, Emily Giraud, 20, que dançou com Vanderweyen ao lado de vários de seus amigos, disse que a mistura incomum de clientela melhorava o clima.

“Cria uma boa atmosfera na casa noturna.” Outra frequentadora, Danielle Okoo, 24, disse que estava impressionada com a energia de alguns dos mais velhos. “Não sei se eu seria capaz de fazer isso na idade deles.”

Nos últimos anos, jovens adultos, especialmente homens, têm sido o foco de relatórios sobre solidão, exacerbada por telas e mídias sociais. Mas o isolamento social tem sido um problema para os idosos há muito tempo, alguns dos quais, com poucas ou nenhuma visita de amigos e familiares, podem ficar isolados em seus apartamentos por longos períodos.

Globalmente, cerca de 1 em cada 4 adultos mais velhos experimenta isolamento social, e esse número está aumentando, disse Hans Henri P. Kluge, diretor da OMS para a Europa.

“Estamos vivendo mais, mas não com mais saúde e não mais conectados”, disse Kluge em uma entrevista. “Há uma cura barata: chama-se conectividade social”, afirmou, elogiando iniciativas como as saídas para casas noturnas.

Você também pode gostar

Deixe seu Comentário