Justamente na semana em que o marido da minha amiga Carla estava viajando, as pragas do Egito se abateram sobre ela. A filha pegou piolho, sua cachorra teve sarna e ela caiu de cama com faringite, cistite e conjuntivite. A mulher virou uma estrofe ambulante daquela música “Pulso” dos Titãs. Tentei ajudá-la, mas peguei um adenovírus que só traria mais chagas à sua pestilenta epopeia.
Carla passava os dias cerrando os olhos ardidos em busca de piolhos na cabeça da filha, com a poodle espalhando sarna no sofá enquanto ardia em febre. Depois de 48 horas do mais puro suco de caos, o marido de Carla finalmente voltou para casa. Respirei aliviada, minha amiga teria ajuda.
Assim que pôs o pé em casa, o cônjuge declarou com a gravidade de quem enfrenta uma guerra no inverno russo: “Estou resfriado”. Veja bem, ele não estava com influenza, Covid ou pneumonia. Era um res-fri-a-do. Entrou com a malinha, como se puxasse um cadáver pesadíssimo, e, sorumbático, caiu de cama: “Tô buito bal”.
Enquanto o marido dormia o sono dos injustos, minha amiga, de olhos grudados e purulentos da conjuntivite, dobrada de dor com a cistite atingindo o rim, garganta em chamas, seguiu passando pente de ferro para piolho, tratando a cachorra e fazendo canja para o moribundo que sequer tinha o nariz escorrendo.
Carla me contou que enquanto ela ardia com 39°C de febre, o infeliz tomava sopinha comentando admirado: “Incrível como vocês, mulheres, suportam melhor a dor”. Sem forças para virar o prato de canja sobre ele, ela só chorou. Não de dor, mas de raiva. No dia seguinte, me ligou perguntando injustiçada: por que a dor deles é mais dolorida que a nossa?
Li em algum lugar, talvez neste jornal, que nas emergências e consultas médicas, mulheres recebem menos analgésicos que os homens pelas mesmas queixas. Cuidamos, mas não somos cuidadas. E isso não é achismo. Nos anos que passei acompanhando meu pai num tratamento oncológico, via pacientes homens cercados de mulheres. Mães, filhas, irmãs, tias que se revezam com uma fidelidade canina. O inverso já não era tão comum. Ao contrário.
Uma médica me contou que nos casos de câncer de mama, por exemplo, cerca de 60% das mulheres são abandonadas pelos parceiros. E não me venha com chorumelas do tipo “o cuidado não é da natureza deles”.
Homens não são educados para cuidar de ninguém. A começar pelos próprios filhos. Assim que os bebês nascem, os pais voltam às suas atividades e, como diz o ditado, “quem pariu Mateus, que embale”.
Falando em parto, não me esqueço da história da Larissa, uma amiga que, em pleno trabalho de parto, viu o marido puxando o médico de lado para pedir um copo d’água e um remedinho para dor de cabeça. E daí se, naquele momento, ela estava com a cabeça de um bebê dilacerando sua vagina? O coitado estava com cefaleia. Caso de internação, de preferência na UTI.