Página Inicial Saúde Médicos optariam por eutanásia em câncer grave e Alzheimer – 11/06/2025 – Equilíbrio e Saúde

Médicos optariam por eutanásia em câncer grave e Alzheimer – 11/06/2025 – Equilíbrio e Saúde

Publicado pela Redação

Mais da metade dos médicos entrevistados em um estudo internacional optariam, em casos avançados de câncer ou Alzheimer, pela sua própria morte assistida ou eutanásia ao prolongamento dos sintomas. A pesquisa revela, também, que as opiniões são fortemente moldadas pela legislação existente em cada país acerca da eutanásia.

Participaram do estudo mais de 1.400 médicos de família, de cuidados paliativos e de especialidades com alta probabilidade de lidar com casos de câncer avançado e doença de Alzheimer. Os resultados foram publicados na revista científica Journal of Medical Ethics.

Os especialistas incluídos foram provenientes de oito regiões com diferentes jurisdições. A eutanásia e a morte assistida são permitidas no Canadá, na Bélgica, no estado americano do Oregon e no estado australiano de Victoria.

Por outro lado, na Itália e nos estados de Wisconsin e Geórgia, tais práticas são proibidas. Em Queensland, Austrália, também incluído no estudo, a legislação autorizando a morte assistida aprovada em 2021, mas o documento ainda não havia entrado em vigor quando a pesquisa foi realizada.

Nos questionários, os especialistas deveriam avaliar como opções péssimas, ruins, boas ou muito boas as práticas de ressuscitação cardiopulmonar (RCP), ventilação mecânica, alimentação por sonda, alívio intensificado dos sintomas, sedação paliativa, uso de medicamentos disponíveis para o fim da vida, suicídio assistido por médico e eutanásia.

As respostas revelam que, de maneira geral, os médicos não consideram as opções de suporte à vida como muito adequadas para o tratamento desses males. Menos de 1% dos entrevistados optariam pela RCP ou pela ventilação mecânica, e apenas 4% pela alimentação por sonda.

Por outro lado, houve quase um consenso entre a comunidade médica em relação ao alívio intensificado dos sintomas, considerado uma opção muito boa por mais de 90% dos entrevistados. Já a sedação paliativa e a eutanásia foram vistas como alternativas viáveis por mais da metade desses médicos, enquanto um terço deles afirmou que consideraria o suicídio assistido em cenários de câncer avançado.

Se por um lado, sexo, idade e etnia não foram variáveis que influenciaram significativamente a escolha desses médicos, por outro a legislação existente em seus países ou estado e sua religião foram. Em geral, aqueles menos religiosos foram mais propensos a considerar o suicídio assistido e a eutanásia (65% e 38%, respectivamente) do que os que professam alguma fé (38% e 40% para as duas práticas).

Quanto à geografia, apenas cerca de 40% dos médicos consideraram a eutanásia com alternativa boa para o cenário de câncer na Itália, que não possui autorização legal, contra até 80% na Bélgica. Isso sugere que fatores externos também influenciam fortemente as atitudes e preferências pessoais desses profissionais.

De maneira geral, a jurisdição favorável aumenta em três vezes a probabilidade de um especialista considerar a eutanásia uma opção muito boa para quadro de câncer avançado, e em duas vezes para pacientes de Alzheimer.

Os pesquisadores tentam apontar razões para os resultados levantados. Uma das hipóteses afirma que médicos em regiões com autorização legal para essas práticas estão mais familiarizados e confortáveis com os resultados, muitas vezes por já terem observado seus resultados clínicos positivos.

Para a advogada e pesquisadora na área de bioética, Luciana Dadalto, uma lei que regulamente a prática é benéfica na medida em que pode estabelecer critérios claros, proteger os mais vulneráveis e garantir que o procedimento, se autorizado, ocorra com limites bem definidos.

A especialista ressalta também que, em países onde a morte assistida foi aprovada, somente cerca de 3 a 4% da população que tem uma doença grave escolhe o caminho da morte assistida. “Estamos falando numericamente de uma parcela muito pequena”, diz.

Um estudo com dados oficiais da Bélgica revela que houve um aumento do número de casos de eutanásia no país desde a aprovação da prática. De 236 inicialmente, hoje somam pouco mais de 3.000 registros anuais. A prevalência foi entre homens e pessoas com 60 anos ou mais.

No Brasil, entretanto, o debate sobre a regulamentação da eutanásia e da morte assistida ainda é incipiente. Para além da estrutura, o debate sobre o direito de morrer no Brasil esbarra também em valores culturais, especialmente ligados à religiosidade. Um estudo analisou a percepção de 32 pessoas do Brasil e do Reino Unido para entender as percepções culturais de cada país quanto ao significado de uma boa morte.

Os resultados mostram que, enquanto britânicos mostram uma necessidade de controle sobre o fim da vida, os brasileiros enfatizaram a espiritualidade como elemento central. Em ambos os contextos, experiências prévias com a morte de entes queridos influenciaram medos e desejos em relação ao próprio falecimento.

Para Edison Vidal, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e um dos autores do estudo, a eutanásia e a morte assistida ainda não são uma demanda da população brasileira, que tem formas diferentes de lidar com o fim da vida em relação aos europeus, ainda que possam ser importantes para alguns indivíduos.

Outra questão que atrasa o debate no país, apontada por especialistas, é a falta de acesso da população aos cuidados paliativos. A política pública nacional de cuidados paliativos só foi estabelecida no ano passado e ainda são pouco mais de 500 paliativistas atuando no país, como a professora Úrsula Guirro, do Hospital Universitário da Universidade Federal do Paraná (CHC-UFPR/Ebserh)

Segundo a médica paliativista, existem também uma lacuna muito grande na formação dos profissionais de saúde, visto que são poucas as faculdades que oferecem essa disciplina na sua grade de formação, e a discussão pouco atinge áreas da saúde para além da medicina, como enfermagem e fisioterapia.

No estudo internacional, embora a eutanásia seja uma opção para a maioria dos médicos, o consenso maior está em torno do alívio intenso dos sintomas e da sedação paliativas. Isso revela que, antes de discutir o fim da vida, é preciso encontrar formas de promover uma vida sem sofrimento.

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