Página Inicial Saúde Não há idade para buscar os Alcoólicos Anônimos – 19/05/2025 – Vida de Alcoólatra

Não há idade para buscar os Alcoólicos Anônimos – 19/05/2025 – Vida de Alcoólatra

Publicado pela Redação

“Sou Aninha, uma alcoólatra”. Uma voz rouca e fina abriu a reunião daquele dia. Os demais esboçaram um leve sorriso, e não era para menos. Dona Aninha era uma senhora de noventa e poucos anos. Chegou acompanhada de uma moça, provavelmente sua cuidadora. Fiquei pensando se eu, caso vivesse até aquela idade, continuaria frequentando o AA…

Não consegui mais prestar atenção na reunião. Observava a sala e tentava chutar a idade dos participantes.

Nunca me esqueço de um dia em que a Rita, uma senhora com forte influência em certa sala de AA, me disse que “os jovens, minha filha, não param fácil. Eles até aparecem, mas vão embora. Têm muito tempo pela frente”. Ela não estava de todo errada, pensei. Naquela reunião, além de dona Aninha, exemplo de lealdade com a irmandade, havia algumas pessoas de meia-idade e poucos jovens na casa dos vinte anos. O mais novo devia ter pouco mais de vinte.

Mas também estava o Danilo, que entrou para o AA com dezessete anos e nunca mais deixou de ir.

Na minha trajetória de recuperação, encontrei inúmeros senhores sábios com muitos conselhos e alguns poucos jovens. Imagino que seja uma questão geracional. Lembro da Barbara Gancia dizer que, entre o Alcoólicos Anônimos e o Narcóticos Anônimos, ela preferia esse último, por ser frequentado por um pessoal mais jovem. É verdade: a irmandade vizinha tem mais garotada —o alcoolismo demora a apresentar problemas graves e as outras drogas já pegam bem mais rápido.

Eu talvez não tivesse permanecido caso tivesse ido lá quando comecei a ter problemas com o álcool. Resgato em minha memória que eu, aos vinte e poucos, já preocupava minha família. Todos percebiam a minha complexa relação com a bebida. Mas é uma questão de tempo entre manifestar certa adicção e apresentar problemas sérios como perder trabalho, amigos, relacionamentos.

Nos meus primeiros dias, eu ficava contando as horas para ir para a sala. Tinha muito medo de tudo, inclusive das pessoas. Faz sentido. Quando parei de beber, foi uma drástica mudança. Eu bebia a toda hora, nada me brecava. Nem quando minha família me interditava financeiramente: eu furtava ou ia às casas de amigos, em busca do meu “remédio”.

Se, como disse, dei sinais de que tinha um sério problema com o álcool por volta dos vinte, só fui ficar absolutamente sóbria bem mais de uma década depois. Portanto, olhar para aqueles poucos jovens na sala me intrigava e até despertava um lado meio malvado. Será que ficariam mesmo em AA e parariam de beber? Duvidava.

Eu sempre me senti acolhida em AA. Cheguei com trinta e tantos anos, e quando ingressamos tudo soa muito urgente. Mas existem fases da recuperação. Pude reconstruir minha vida de forma inacreditável. É bobagem achar que aos noventa anos não iria mais a uma sala. Quem entra e experimenta a nova forma de vida, não larga por nada.


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