Página Inicial Saúde ‘Positividade tóxica’ nega sentimentos reais – 29/05/2025 – Equilíbrio

‘Positividade tóxica’ nega sentimentos reais – 29/05/2025 – Equilíbrio

Publicado pela Redação

Recentemente, estava trocando mensagens de texto com um amigo quando ele parou por um momento antes de dizer: “Vou fazer uma biópsia na semana que vem para tratar de um tumor na bexiga”.

Agradeci por ele ter compartilhado comigo e acrescentei: “Você sabia que eu tive câncer testicular? Um dos meus mantras arduamente conquistados na vida é: esperar para se preocupar”.

Após ouvir, ele completou: “Não sou de me deixar consumir pela preocupação. No entanto, sei que suas palavras são bem-intencionadas, mas você já ouviu falar do termo ‘positividade tóxica‘?”

Eu tinha. Mais ou menos… Para ser sincero, “mais ou menos” era forçar a barra. Eu já tinha ouvido “positividade tóxica” como um termo da moda, mas não tinha pensado muito sobre o seu significado —certamente nunca se aplicaria a mim, certo?

Agora, eu me perguntava: por que “esperar para se preocupar”, um comentário que eu pretendia ser útil, provocou a repreensão?

O termo “positividade tóxica” ganhou popularidade nos últimos anos para descrever uma forma pouco saudável de reprimir emoções negativas em nome da positividade. O Google Trends mostra que as buscas pela expressão começaram a surgir em 2019, com discussões crescentes em textos e blogs, novos estudos e até mesmo um livro de 2022, “Positividade Tóxica: Mantendo a Realidade em um Mundo Obsessivo por Ser Feliz”, de Whitney Goodman.

Psicólogo e professor-adjunto da Universidade Columbia, Graham Reynolds classifica desta forma: “A positividade tóxica ocorre quando se espera que declarações encorajadoras minimizem ou eliminem emoções dolorosas, criando pressão para ser irrealisticamente otimista sem considerar as circunstâncias da situação.”

Susan David, que é psicóloga em Harvard, expressa isso de forma ainda mais sucinta, chamando o conceito de “supressão emocional”.

Ao relembrar a conversa que tive com meu amigo, percebi que, inadvertidamente, havia negado sua ansiedade sobre um possível diagnóstico de câncer. Em vez disso, eu teria sido mais útil se tivesse encarado seu medo de frente, dizendo: “Isso é assustador. O que posso fazer por você?” (Melhor ainda: “Posso fazer uma pesquisa para você?” ou “Gostaria que eu fosse com você na próxima consulta?”)

Também decidi pedir exemplos a vários especialistas, e foi isso que ouvi. As sugestões se concentram em como validar os sentimentos de alguém e não em como reconfigurar a vida dela como um filme da Hallmark (canal norte-americano que transmite filmes de comédia romântica), com seu final feliz obrigatório.

Não diga: “Apenas mantenha-se positivo”, mas sim: “Essa deve ser uma situação difícil para você.”

Não diga: “Tudo acontece por uma razão” ou “Quando uma porta se fecha, uma janela se abre”, mas: “Sinto muito que você esteja passando por isso”.

Não diga: “Olhe para o lado bom”, mas sim: “Isso é uma pena. Como posso te ajudar?”

Embora eu tivesse começado a entender as desvantagens da positividade tóxica, que às vezes é chamada de “falsa positividade forçada”, David oferece um contexto ainda maior.

São feitas distinções entre emoções positivas (felicidade, alegria), que são “percebidas como boas e maravilhosas”, e sentimentos negativos (raiva, tristeza, ansiedade), afirma David, e muitos profissionais de saúde mental tentam afastar rapidamente seus pacientes desses últimos, que parte das vezes são considerados prejudiciais ou contraproducentes no processamento da perda.

Mas David diz que reprimir esses sentimentos percebidos como negativos é uma forma de negação.

Positividade tóxica significa usar uma linguagem que “parece boa superficialmente, mas na verdade o que você está dizendo é ‘meu conforto é mais importante que a sua realidade’. Às vezes, usamos frases superficiais só para sermos positivos porque nos sentimos desconfortáveis com a conversa”, afirma a psicóloga.

Me lembrei das mensagens que troquei com meu amigo e do uso da expressão “esperar para se preocupar”. É verdade que eu não o deixei expressar completamente seu medo e ansiedade, e isso aconteceu, pelo menos em parte, porque isso me deixava desconfortável.

Lembrei dos longos meses, décadas atrás, em que estive em meio a tratamentos contra o câncer. Quando me perguntavam como eu estava, eu frequentemente respondia: “Bem”, o que, mesmo naquela época, eu sabia que era ignorar meus sentimentos. A alternativa? “Estou enjoado. Tenho feridas na boca. Estou constipado. Estou apavorado.”

Por não conseguir compartilhar a verdade emocional de duas cirurgias e quatro rodadas de quimioterapia, eu me isolava, o que limitava minha capacidade de buscar o apoio das pessoas mais próximas. Muito antes de ter um nome, eu já bebia o suco em pó da “positividade tóxica”.

De volta ao tema da “supressão emocional”, David inclui os casos em que ela é autoinfligida. “É quando se tem essa ideia de que estou me sentindo triste, mas não deveria estar triste porque muitas pessoas estão piores do que eu, ou que eu deveria simplesmente ser grato”, completa ela. Eu estava pensando: “O que há de tão ruim nisso?”, quando ela acrescenta: “Suprimir nossas emoções ou colocá-las de lado tem um impacto real em nosso bem-estar a longo prazo”.

Com isso, ela quer dizer que isso pode prejudicar nossa saúde psicológica, o que atrapalha nossa capacidade de resolver problemas (por exemplo, decisões envolvendo seguro ou tratamento), de obter apoio crucial e de fazer o que os psicólogos costumam chamar de “construção de sentido”, que é como extraímos significado de uma experiência. David inclui: “A construção de sentido é, na verdade, uma parte crucial da vida e da recuperação, a capacidade de seguir em frente.”

Durante a minha doença e por anos após, continuei, ou seja, retomei a programação regular assim que pude. Não reservei tempo para lidar com as emoções complexas que o câncer desenterrou, as quais agora percebo que me mantiveram estagnado. Para outros, eu era o guerreiro do câncer feliz e destemido. À noite, eu ficava acordado, dominado pelo medo.

Mas negar nossos próprios sentimentos ou ter eles reprimidos por outros tem outras consequências.

Em um artigo de 2024, “O Lado Sombrio das #VibraçõesPositivas: Compreendendo a Positividade Tóxica na Cultura Moderna”, Zoe Wyatt, terapeuta e pesquisadora especializada em trauma, escreveu que a “invalidação de experiências emocionais humanas genuínas” pode levar a consequências psicológicas adversas, incluindo aumento do estresse, redução da resiliência emocional e prejuízos aos nossos relacionamentos interpessoais, bem como problemas de saúde mental, como ansiedade, depressão e transtornos psicossomáticos. Em outras palavras, pode nos impedir de processar ou lidar com experiências emocionais genuínas.

Então, o que podemos fazer?

Especialistas sugerem uma série de medidas para evitar cair em positividade tóxica:

  • Reconheça os sentimentos dos outros: não os descarte com frases prontas como “apenas continue positivo” ou “poderia ser pior”.
  • Reconheça seus próprios sentimentos: permita sentir tristeza, pesar ou medo, sem julgamento.
  • Não categorize as emoções como “boas” ou “más”: em vez disso, como David aconselha, pense em todas as emoções como algo que o leve a uma maior compaixão, curiosidade e aceitação. Todas as emoções podem ajudar a encontrar um caminho em tempos difíceis.

Quanto ao meu amigo que aguarda o resultado da biópsia da bexiga, ele está bem. Nenhum câncer foi encontrado.

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