Acontece em Arujá (SP) no próximo feriado prolongado, de 1º a 4 de maio, o 3º Festival Indígena União dos Povos (Fiup). Será na Fazenda Arujabel, a 50 minutos de carro da capital, com participação de líderes de 15 povos, entre eles o cacique Raoni, que fará o discurso de encerramento.
Além de atividades culturais e uma cerimônia com as chamadas medicinas da floresta, serão apresentados painéis de debates. No que respeita ao tema deste blog, ocorrerá na sexta-feira (2), das 10h às 12h, a roda de conversa Avanços Científicos e Acessibilidade das Plantas Nativas, como a ayahuasca.
Na mesa estarão Lúcia Alberta Baré, Francisquinha Shawãdawa, Cunhã Dju Tupi Guarani, Léo Artese e Luís Fernando Tófoli. Eles vão retomar a discussão renovada em janeiro, na 5ª Conferência Indígena da Ayahuasca, sobre a relação tensa entre o uso tradicional do chá na Amazônia, de um lado, e grupos que utilizam a bebida em contexto urbano, aí incluída a pesquisa científica, de outro.
No sábado às 15h haverá outra roda de conversa sobre a questão, Exploração das Tradições Indígenas – Apropriação Cultural e Uso da Ayahuasca em Contexto Urbano. Participam Rasu Yawanawá, Ninawa Pai da Mata Huni Kuin, Makairy Fulni-ô, Daiara Tukano e Jairo Lima.
Tófoli, psiquiatra e pesquisador de psicodélicos na Unicamp, é coautor de artigo recente sobre a comoditização de terapias psicodélicas, com Emilia Sanabria, da Universidade Paris Cité. Eles defendem a importância de incorporar uma dimensão comunitária aos cuidados por essa via, como ocorre em práticas tradicionais, em contraste com o foco no indivíduo predominante em biomedicina.
Segundo Tófoli, o Brasil ocupa uma posição peculiar na cena da ciência psicodélica. A legalização do uso religioso da ayahuasca criou um quadro legal que facilitou pesquisas com a bebida, nas quais se evidenciou seu potencial antidepressivo, por exemplo. No entanto, a norma resultante contempla igrejas urbanas como Santo Daime, mas não de modo explícito o uso ritual pelos povos que apresentaram o chá a não indígenas.
“A comercialização arrisca tornar essas práticas rituais produtos de luxo, pois já há pessoas que pagam milhares de reais para se curar com ayahuasca e cogumelos em contexto underground”, alerta o psiquiatra.
“O maior dos riscos está em determinar quem será o ‘dono’ da ayahuasca –aqueles que buscam um uso integrado com a natureza e o futuro do planeta, ou aqueles que, afinal, apenas querem possuí-la.”
A 5ª Conferência, realizada no Acre no final de janeiro, reafirmou que o conhecimento indígena é coletivo e sagrado, não podendo ser comercializado nem patenteado. Ali se criou um Conselho de Lideranças Espirituais Indígenas que batalhará por consentimento prévio, livre e informado de comunidades para a realização de estudos científicos, além da repartição de eventuais benefícios.
“Precisamos de diretrizes para engajamento ético com as práticas indígenas”, diz Tófoli, “com consentimento apropriado, para evitar práticas exploradoras e cultivar uma colaboração genuína.”
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