Página Inicial Saúde Só 1/5 das unidades básicas de saúde faz inserção de DIU – 23/06/2025 – Equilíbrio e Saúde

Só 1/5 das unidades básicas de saúde faz inserção de DIU – 23/06/2025 – Equilíbrio e Saúde

Publicado pela Redação

Apenas 19,7% das UBSs (Unidades Básicas de Saúde) do país fazem inserção de DIU (dispositivo intrauterino), método contraceptivo reversível e de longo duração bastante eficaz na prevenção da gravidez, mostra censo nacional do Ministério da Saúde.

O documento, que realiza um diagnóstico de cerca de 50 mil estabelecimentos de saúde da APS (Atenção Primária à Saúde) no SUS (Sistema Único de Saúde), revela também que 60,4% das unidades de saúde precisam de reforma ou de ampliação e que só 21% delas contam com sala para coleta de exames laboratoriais.

Embora o censo não tenha investigado a razão da baixa taxa de inserção de DIUs nas unidades de saúde, médicos e gestores atribuem esse cenário à falta capacitação e de segurança dos profissionais generalistas (muitos pensam que seja função do ginecologista) e à desinformação que cerca o tema.

“O [programa] Mais Médicos não treina de fato para procedimentos. Falta médicos com formação adequada, falta material. Colocar DIU com especialista é um fracasso do sistema. Ginecologista tem que ficar com as condições mais específicas, como câncer de mama, endometriose”, diz o médico de família Gustavo Gusso, professor de clínica geral da USP (Universidade de São Paulo).

Fabiano Guimarães, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina e Comunidade, considera que o principal entrave seja a falta de treinamento para fazer a inserção. “Não é um treinamento complexo, todas as residências de medicina de família têm, só que existe ainda muita gente não capacitada.”

Segundo ele, a falta de material é muitas vezes ocasionada pela falta de demanda por esse procedimento. “Quanto se tem demanda de implantação, o DIU é comprado. Mas, às vezes, [falar que falta material] pode também ser desculpa [para o médico para não fazer].”

A enfermeira Carmem Silvia Guariente, 2ª vice-presidente do Cosems-SP (conselho paulista dos secretários municipais de saúde), afirma que na atenção básica há uma insegurança dos profissionais médicos em realizar o procedimento, mesmo quando capacitados.

“Essa insegurança pode ser receio de complicação, mesmo sendo um procedimento simples, ambulatorial, mas também pode ser porque, pelo menos no estado de São Paulo, ainda há muitas unidades de saúde tradicionais em que esses procedimentos são feitos pelo ginecologista”, diz ela.

Outra dificuldade, afirma, é que muitos profissionais entendem que após a colocação é preciso realizar um ultrassom para verificar, por exemplo, se o dispositivo está no lugar certo ou se há alguma infecção.

“Embora o manual do ministério recomende o exame em situações bem específicas, muitos médicos colocam isso com uma questão. E como muitos dos municípios, às vezes, não tem ultrassom ou a oferta é limitada, acaba dificultando [o acesso ao DIU].”

Guariente diz que há também resistência de algumas equipes em realizar o procedimento devido ao excesso de demandas na atenção básica e o número insuficiente de profissionais. “Tem o acompanhamento dos crônicos, as ações preventivas, tirar a unha encravada, fazer sutura, lavagem de ouvido. A demanda por atenção espontânea é muito grande. Consome tanta a agenda que o profissional não consegue fazer o procedimento.”

Ela cita ainda questões culturais que levam as mulheres brasileiras ainda preferirem a pílula como método anticoncepcional, embora a efetividade do DIU seja maior. “Há alguns credos de que [o método] é abortivo, que tem uma série de problemas. Isso tudo a gente precisa desmistificar porque não é real.”

O dispositivo oferecido em UBSs e hospitais com atendimento ginecológico é o de cobre. Ele funciona por ter uma alta concentração de cobre que deixa o espermatozoide estático ou com uma movimentação não adequada para chegar até os óvulos. Não interfere na fertilidade a longo prazo e é considerado uma boa opção para mulheres que não podem ou não desejam usar métodos hormonais.

No entanto, dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS/IBGE) de 2019 mostram que, entre as mulheres em idade reprodutiva (15 a 49 anos), o DIU é utilizado por apenas 4% dessas brasileiras. A pílula anticoncepcional é o método mais usado (38%), seguido pela camisinha masculina (21%) e esterilização feminina (19%).

Para Guariente, o DIU é um aliado importante da mulher para evitar gravidezes indesejadas. “É um método não hormonal, que pode ficar no corpo por até dez anos, que não requer que a mulher se lembre todo dia de tomar um medicamento. Ela pode esquecer, vai ter gravidez não planejada que, às vezes, pode resultar em um aborto, em um grande risco.”

Na opinião da médica Fátima Marinho, pesquisadora da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), o baixo uso do DIU nas UBSs é resultado da falta de incentivo e de campanhas de esclarecimento. “Existe muito preconceito, falta de conhecimento e informações falsas. Isso deixa as mulheres inseguras e faz com que a demanda seja pequena.”

O mesmo motivo, segundo ela, faz com que os profissionais de saúde fiquem receosos em propor o método. “Ele existe, está disponível no SUS e é de boa qualidade, mas não tem solicitação [ao ministério] por falta de demanda.”

Estudos que buscam investigar as razões dessa baixa adesão do DIU citam a falta de informações sobre contraceptivos e saúde reprodutiva, de acesso a profissionais e programas de saúde reprodutiva e a percepção de que o DIU pode apresentar riscos à saúde.

Na opinião de Fabiano Guimarães, muitas vezes o DIU não é oferecido pelo profissional de saúde porque ainda eles ainda ouvem pouco as mulheres na hora de tratar sobre direitos reprodutivos.

“Muitas vezes o profissional é que está na posição de indicar, não é a mulher que decide. E esse profissional pode indicar por comodidade, indicar aquilo que é o mais simples e não aquilo que é a decisão da mulher.”

Em nota, o Ministério da Saúde diz que atua junto aos estados e municípios brasileiros para ampliar o acesso a métodos contraceptivos na atenção primária à saúde, incluindo o DIU. Entre as iniciativas, afirma, conduz a qualificação de profissionais_incluindo mais de 4.700 médicos do Mais Médicos e enfermeiros em regiões remotas, como a Ilha do Marajó.

Informa também que está em andamento a implantação de cinco centros de multiplicação dessa prática em capitais (Macapá, Salvador, Belém, Recife e Porto Velho).

De acordo com o ministério, o número de DIUs inseridos a partir do atendimento na atenção primária aumentou 55% nos últimos dois anos_passou de 52 mil procedimentos, em 2022, para 80,3 mil em 2024.

“São destinados R$ 2,8 bilhões por ano às equipes de saúde da família das Unidades Básicas de Saúde que atualmente realizam o procedimento. Os dispositivos são distribuídos trimestralmente aos estados do país”, informa.

O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promoção da saúde

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