De acordo com levantamento do Ministério do Trabalho, as mulheres e pessoas negras seguem sendo maioria no setor. Mudanças demográficas e o aumento da contratação de diaristas estão entre as causas. Trabalho doméstico com carteira assinada cai 18% em 10 anos e envelhece.
Sebastián Santacruz na Unsplash
O número de trabalhadores domésticos com carteira assinada no Brasil caiu 18,1% entre 2015 e 2024, de acordo com o Sumário Executivo da RAIS/eSocial, divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego nesta quinta-feira (15).
O levantamento aponta que o Brasil contava com 1,64 milhão de trabalhadores domésticos formais em 2015. Esse número caiu para 1,34 milhão em 2024 — uma redução de quase 300 mil vínculos. (veja o comparativo abaixo)
Evolução do trabalho doméstico formal nos últimos dez anos
Arte g1
Historicamente marcado por alta informalidade, baixa proteção social e desigualdades de gênero e raça, o setor passou por transformações significativas nas últimas décadas.
Segundo Paula Montagner, subsecretária de estatísticas e estudos do trabalho, existem algumas possíveis explicações para a queda no número de trabalhadores domésticos com carteira assinada: mudanças demográficas e o aumento da contratação de diaristas, como forma de evitar encargos trabalhistas.
“Eu acredito que a diminuição da demanda por empregadas domésticas seja porque as famílias estão tendo menos filhos e as residências estão menores, além da tentativa dos empregadores de evitar custos como FGTS e contribuição previdenciária”, explica a especialista.
O envelhecimento populacional e a diminuição do tamanho das famílias já influenciam a oferta e a demanda por trabalho doméstico no Brasil. Além disso, a pandemia impactou fortemente as contratações no setor, especialmente devido ao isolamento social. (saiba mais abaixo)
Perfil parecido, idade mais avançada
A redução dos vínculos formais foi observada em quase todos os estados, exceto em Roraima, Tocantins e Mato Grosso. As maiores quedas ocorreram no Rio Grande do Sul (-27,1%), Rio de Janeiro (-26,1%) e São Paulo (-21,7%).
Comparativo por estado do emprego doméstico formal entre 2015 e 2024
Arte g1
Mas o perfil dos trabalhadores pouco mudou: 89% dos empregos domésticos formais ainda eram ocupados por mulheres no ano passado, uma leve redução em relação aos 90,5% registrados em 2015. Metade dos vínculos formais continua sendo preenchida por pessoas pretas e pardas.
Em 2024, pessoas negras representaram 54,4% dos vínculos formais no trabalho doméstico. O número de mulheres com carteira assinada caiu 19,6% no período, enquanto entre os homens a redução foi bem menor, de apenas 3,5%.
O estudo também revela um envelhecimento acelerado da força de trabalho: 45% dos trabalhadores têm 50 anos ou mais. As faixas etárias mais jovens (entre 18 e 39 anos) registraram quedas significativas, especialmente o grupo de 30 a 39 anos, que teve retração de 47,3%.
Houve avanço no nível de escolaridade das trabalhadoras formais. A proporção de domésticas com ensino médio completo subiu de 28,5% em 2015 para 40,9% em 2024. Já o número de profissionais com ensino superior completo cresceu mais de 70,8%.
Perfil do trabalhador doméstico formal em 2024
Arte g1
Houve uma forte redução entre os trabalhadores sem instrução (-46,8%) e com fundamental incompleto (-41,1%). “É um avanço significativo na compreensão das dinâmicas do trabalho doméstico formal no Brasil”, afirma Paula Montagner.
A maior parte das profissionais atua como empregada doméstica em serviços gerais (76,8%), seguida por babás (9,1%) e cuidadoras de idosos (5,8%). Em 2024, 67,5% das trabalhadoras cumpriam jornadas superiores a 40 horas semanais.
A média nacional de jornada foi de 40,6 horas semanais. A remuneração média da categoria também aumentou, passando de R$ 1.758,58 em 2015 para R$ 1.875,87 em 2024 — um crescimento real de 6,7%, acompanhando o reajuste do salário mínimo
Principais ocupações no trabalho doméstico formal no Brasil em 2024
Arte g1
Efeitos da pandemia
Em 2020, durante a pandemia de Covid-19, muitas empregadas domésticas com carteira assinada perderam seus empregos e, como alternativa, passaram a atuar como diaristas no modelo de Microempreendedora Individual (MEI).
Segundo o Ministério do Empreendedorismo, são 309 mil diaristas registradas como MEIs no Brasil. Essas profissionais prestam serviços domésticos até dois dias por semana, com pagamento por diária, realizando atividades como faxina, limpeza, lavagem de roupas e preparo de refeições.
“Ao se tornar MEI, a empregada faz uma contribuição previdenciária reduzida, de apenas R$ 85, o que é bem inferior à contribuição de quando ela era registrada. Isso pode prejudicar a aposentadoria”, completa a especialista.
Segundo Mariana Almeida, analista técnica de políticas sociais do MTE, o trabalho doméstico é fundamental tanto na vida cotidiana quanto na atividade produtiva das mulheres no Brasil.
Ela destaca que, apesar do avanço na escolaridade, é urgente implementar políticas que melhorem as condições de trabalho no setor, assegurando maior proteção social e valorização salarial.
A pandemia impactou significativamente a dinâmica de contratação. O setor foi um dos mais afetados pela crise, o que dificultou sua recuperação. Os efeitos são duradouros sobre a oferta e a demanda por trabalho doméstico.
Já Dercylete Lisboa, coordenadora-geral de Fiscalização do Trabalho, afirma que o estudo pode orientar as ações da Inspeção do Trabalho em diferentes estados e regiões.
Além da fiscalização, ela ressalta que os dados são essenciais para promover a conscientização sobre a relevância do trabalho doméstico e de cuidados.
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